sábado, 23 de maio de 2009

Heartless

Eu sou, desde aquele momento, incapaz de sustentar minha própria vida. O sangue que corre em minhas veias é bombeado pela força do coração de outro alguém, despejado em minhas mãos e consumido pelos meus lábios. Ao primeiro gosto de sangue, e a dolorosa sensação do músculo que volta a trabalhar, me lembram do gosto nauseante e da sensação perturbadora que é a continuidade da vida.
A cicatriz profunda em meu peito marca o dia, em que depois de esfaqueada ouvia claramente dizer: seu coração a mim pertence, portanto o meu pertencerá a você! O gosto em meus lábios e a substituição do frio pela dor, trouxeram à tona a sensação pulsante e a desesperadora realidade de meu amante morto aos meus pés. Mas um coração arrancado não bate por muito tempo, sua força se perde descendo pela garganta.
-Bruxa!
-Sua sem coração!
Sem coração, sem coração. Que posso eu fazer se não provar de outros? Se não tomar a força daqueles que batem fortes... Apenas morrer... E eu não quero morrer, mesmo depois de ter vivido tanto tempo, com esse gosto e essa dor. Ainda assim, agindo como se nada sentisse e tudo que quisesse era mais um peito sadio para partir e devorar, ainda assim meus olhos se perdem pela janela.
-Meu amor, meu amor, meu amor...
E nas mil vezes que sussurrei, ouvi apenas o eco da minha própria voz. E não há quem possa me dizer se um dia ouvirei resposta, se algum outro dia, algum outro alguém, me daria voluntariamente seu coração repleto de sentimentos, sorrindo para mim. Sem pedir nada em troca, mesmo porque... Debaixo dessa cicatriz profunda, atrás dos lábios envenenados, já não há mais nada que eu possa dar.

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