sábado, 5 de dezembro de 2009

Cara ou coroa?

Não havia nada que pudesse fazer, pois já não era uma questão de vontade. Conhecia muito bem os próprios desejos, mas em algum lugar além do sutil castanho havia desejos de outra pessoa e os desconhecia. Podia ter intuições, palpites, sentir leves variações, mas nunca teria certeza e, portanto, não era uma questão de vontade. Se tivesse alguma certeza na vida poderia estender a mão, àqueles poucos centímetros finais, mas não podia fazer nada.
-Bla bla bla...
Nem prestava muita atenção no tema da conversa, nem na direção que ela ia, jogava palavras fora para dar continuidade, sem o menor interesse no assunto, só queria continuar ali. As palavras fugiam, derramadas num ritmo continuo e inexato, porque nenhuma delas expressava o que realmente pensava, sentia ou que queria dizer, perguntar, fazer. Você me ama? Não é exatamente uma pergunta difícil, mas soa tão trivial, estúpida. Que tipo de idiota não sabe quando é amado? Então a conversa se estendia sem objetivo ou significado algum.
-Vamos voltar...
A sentença, o final da conversa, a volta ao silêncio inadequado e torturante, a proximidade numa distância de olhares que não se encontram. Não havia nada mesmo que pudesse fazer? Nenhuma certeza? Nenhum ímpeto de coragem e despreocupação? Irrelevante às dúvidas e incógnitas? E as palavras saem na minha mente, apesar de meus lábios não a carregarem até seus ouvidos:
-Eu queria beijar você...~
O primeiro impulso, a primeira vontade, mas não era só isso. Queria tirar seus óculos e os colocar de lado, passar os dedos entre seus cabelos, puxar para perto pela cintura, envolver nos braços, sorrir ao lado, recostar em seu ombro, contar algo ao ouvido, entrelaçar dedos, puxar sua mão. Mas o que eu posso fazer, na dúvida de sua reação? O sucesso e felicidade da proximidade ou então a derrota frustrante de uma maior separação. Cara ou coroa? Eu jogo a moeda?

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Saudades

Arranhando a superfície
Do que nunca vou alcançar.
Como se fizesse diferença,
Como se não pudesse duvidar.

Eu não sei o que sinto,
Provavelmente não é nada.
Mas eu sinto falta disso,
Sem nem saber o que me falta.

Ainda que não conheça amor,
Eu sei que teria saudades do seu.
Ainda que não conheça a dor,
Me dói algo que se perdeu.

Passando os dedos na superfície,
Sem nunca poder tocar o fundo.
Mesmo que eu não saiba de nada,
Eu sei que quero algo fora do meu mundo.

Eu não conheço,
Eu não sinto,
Mas que falta me faz.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Sing alone


Sing alone to the world
Let your song build a smile.
And when I hear your voice,
I will know I am alive.

There were times for our tears,
There were rocks on our way.
But you haunted my fears,
Singing me to that place.

Now I hear it, every night
Dancing around my dreams.
Our favorite song,
Wrote on joy and my tears.

And I hear it, in my heart,
And I know you were here
To sing me that old song,
That will set my mind free.


I sing alone to the world,
Now that you’re not here.
My favorite song,
My smile and my tears.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Escuro

Eu sei que você não mudou nada,
e que minha voz no seu ouvido,
mão nos seus cabelos, quase mágica,
vão fazer você conseguir dormir.

E eu sei que procurando meu braço,
alguém em quem se segurar
ou apenas pelo calor do contato.
você esteve noite adentro.

Somos todos crianças,
num esconde esconde contínuo.
Mas eu sei onde você está,
num lugar seguro ou infinito.

Temos todos medo do escuro,
quando essa segurança nos faltar.
E temos todos pouco tempo,
pra voltar praquele lugar.
Aonde seguros, ninguém nos acha.

sábado, 24 de outubro de 2009

Call back

Mission failed, game over
Call back the gamers
It's time for round two.

Hurry! Reload your guns
put on your armor
It's coming back for you.

Once you came down,
Once was fucked up.
Now restart your mind,
call back and get up!

sábado, 17 de outubro de 2009

Carta sem destinatário

Já faz tanto tempo, que eu já nem sei o que eu devia escrever aqui, nem posso começar a relembrar os bons e velhos tempos, porque não lembro quem você é, quem fomos e o que fizemos. Eu não falo isso por maldade, é que toda nossa história parece um sonho, não tenho certeza se foi real e muitas coisas me parecem tão confusas.
Mas ainda assim eu tenho várias coisas presas aqui dentro, que eu gostaria de compartilhar com você... Mesmo que eu também seja apenas uma lembraça vaga em sua memória. Antes de tudo, obrigado. Obrigado por existir, mesmo que eu descubra que você não existe, obrigado. Eu não sei bem porque, mas só por você por um momento ter me visto e reconhecido, eu deixei de ser um fantasma.
Eu não sou boa com sentimentos, nem relacionamentos... Na verdade eu sou terrivel com pessoas, confesso. Mas tem alguma coisa no modo como o tempo passa, que faz tudo parecer mais claro. Eu agora entendo, mesmo que com lembranças vagas, muito melhor tudo que aconteceu e você significou para mim.
O seu sorriso era o meu valor, porque minha única utilidade quando você estava triste era criar esse sorriso. Os seus olhos eram minha culpa, pois eu sentia que cada vez que você me olhava poderia encontrar todos meus erros e defeitos. As suas mãos eram meu medo... Porque se algum dia alguém realmente me tocar, onde realmente importa, eu temo que minha mente se rompa... E eu nunca mais vou recuperar a segurança, o conforto e todo meu reino isolado.
Não me entenda mau, não havia nada de errado com você, mas há tudo de errado comigo. E só nessa distância eu me sinto bem o bastante para agradecer e amar você por ter existido na minha vida.

Obrigado.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Step over

You’ve made me so hot,
And made my dreams so wild.
But then it all turned cold,
Sour, dirty and mild.

I’m gonna let the door open,
And you can keep the key too.
So when you come back smiling,
I’m gonna step all over you.

People you hate,
People so low.
Bad things around,
Step over it all.

Pickpockets in the Station,
Muderers and rapists in my head.
The air of the city nauseating
Make me wanna stay in bed.

I collect scars and tears,
Being stronger after being sick.
Come back and try to hit me,
I'm gonna step all over it.

Things you take,
Things to blow.
Bad people around,
Step over it all.

Regrets and goodbyes,
Waving back your sorrows.
Deception and deceive,
It’ll repeat itself tomorrow.

Let’s do it over and over,
Because I can take that and more.
Walking over my problems,
Won’t be me on the floor.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Make me laugh

I dont care if you wont come back,
not even if it's not meant to last.
As long as , when you're here
you make me laugh and beg and sing.


Cause I am tired of the silence,
od that dumb old record playing.
And if you can put the sound in my mouth,
maybe it wouldn't be so damn annoying.

So make me sing one last time,
and we will laugh together, out of key.
And make me beg for you to stay,
even if I would be just kidding.

Nothing lasts forever, but we can cease today.
I will never beg of you anything I couldn't take.
But I still would like to share a laugh with you,
making stupid noises, singing you farewell.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Sem conserto

Não precisa ser gentil,
não precisa ter cuidado.
Já está tudo quebrado.

Não precisa ter medo,
não precisa de mais nada.
Eu já estou toda quebrada.

E não há conserto,
e mesmo que houvesse,
eu não pedi nada disso.

E não há motivo,
pra mesmo que quisesse,
se importar com isso.

sábado, 29 de agosto de 2009

Yue

Eu ainda posso vê-la, basta fechar meus olhos... Minha mente me carrega para onde ainda estou sob sua luz, aonde você pode me envolver, aonde eu sempre quero estar.

Perdoará algum dia minha ausência? Minha distância? Meu rosto voltado para o outro lado? Por favor, perdoe... Pois não importa aonde estou, por quanto tempo, ou o que vejo. No fim do dia é você quem eu desejo.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

O Monstro do armário

Já viu quão grandes são as sombras,
quando você ainda é tão pequeno?
E quão escuros e profundos são
cada cantinho em um terreno?

As quedas maiores, as dores exageradas,
a imaginação que deixa a visão ampliada.
Porque eu podia jurar que eu via,
um monstro dentro do armário.

Os sons mais altos e ruídos terríveis,
a medo sobre situações incríveis.
E eu posso jurar que podia ver,
um monstro dentro do armário.

Mas ninguém mais pode ouvir,
ninguém mais enxerga como eu.
Só me acusam de mentir,
que nada disso um dia aconteceu.

Mas eu sei que ele está lá,
emaranhado nas sombras e roupas.
E não há ninguém para tirar,
o monstro das minhas trouxas.

Se ninguém acredita,
ninguém pode me salvar.
E um dia o monstro no armário,
eu sei que ele um dia, vai me devorar.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Não sou

Eu não sou o que você quer,
mesmo que você insista.
Já não tem mais jeito
de mudar. Então desista.

Eu não sou o que você pensa,
mesmo que tenha certeza.

Que certeza você pode ter,
sobre alguém que não você?

domingo, 16 de agosto de 2009

Não me pergunte


Não me pergunte isso,
Porque eu posso responder.
Não se importe com isso,
Porque não tem a ver com você...


São só perguntas e respostas,
Com as quais eu não me importo.
Mas se você se afeta tanto,
Não me pergunte, eu lhe rogo.


Não me pergunte isso,
Porque eu sei como responder.
E talvez não lhe agrade,
O que você pode entender.


São só perguntas e respostas,
Que se encaixam melhor em mim.
Mas quando você as ouve,
Já não parece tão simples assim.


Então não me pergunte,
Você não vai querer saber.
E nenhuma resposta vai
Te ajudar a me entender.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Ali

Você já se olhou no espelho, por tempo o bastante, até que outra pessoa olhasse de volta? Até encontrar aquelas diferenças que demonstram que aquele não pode ser você? Eu já...E por horas encarei aquela outra pessoa, tentando entender como podia fazer parte de mim...

Não pode, não quero... Mas ali está ela, agora e sempre que eu olhar no espelho. Com o mesmo sorriso que subjulga àqueles que o contemplam, acusando e regozijando, cada palavra cruel que posso ver em sua mente, vagando pelos seus olhos.

E se ela está ali, se ela é o que é... É minha culpa também.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Blind

Those are the same stars, everynight they keep on falling. I can still remember, that glimering light that crossed the skies and burned my face, kissing my eyes goodbye. Those are the same, the silent light, the everlasting shine...

"Why did you bring me here?"

Those are real you know?

"What?"

Past, future... Are just names. But this night, the darkness giving goodbye to the sun, the embrace of the stars falling and glowing... It's all real and here. I wanted to share it with you...

"You're going away aren't you?"

I feel like I have too. All those shadows, and the lights that dance around it... The silence in the midnight hour, pale lights shivering... Is like they are calling me somewhere, somehow... I just can't say no, I just can't stay...

"Why? Will you come back?"

I don't know. But don't worry about it...

"That's not possible..."

Come... Share this night with me! Tell me, are the stars still falling? How much they shine? Does it hurt your eyes? I wish I could watch it with you... Be my eyes!

"They are falling, in neverending darkness... The shadows embrace it all... Does't hurt... But I wish I couldn't see it..."

Why?

"So I could lie... And it would neverend, the day would never come burn my eyes, and you would never leave me again."

Silly. Those are fallen stars, the day can't stop them. And besides, you NEVER lie to me.

"How do you know?"

I am blind, but I ain't dumb. You know something? Sometimes I wish I could dive into the night, swim across the dark sky, dancing around the fallen stars... But when I am with you like this, I feel like I am already there, doing it all... Funny isn't it?

"No..."

Are you crying?

"..."

Do you think that the fallen stars, are the teardrops of the night? Maybe the sky is just so sad that it cries light to us?

"Why would it be sad?"

I don't know... Maybe it miss someone or something...

"Maybe."

I can feel it, the stars coming down, the shadows breathing slowly, waiting for the day to come... Make a wish on that falling star! For both of us! A teardrop of light, and you'll have your hearts desire...

"You're making that up..."

No I am not. It's a fallen star promise. A teardrop of light away, is your hearts desire. Do it for us, okay? I want to see your wishes come true...

"You can't see."

Maybe not like you... I wonder... Did you made your wish already? Come on, before the last one falls!

"I wish you would come back to me..."

domingo, 12 de julho de 2009

domingo, 5 de julho de 2009

Bom dia

Senti mil vezes sua falta essa noite e mil vezes a repeli buscando seus braços...
Ouvi mil vezes a coruja agourando e o rouxinol cantando... Me dê mais abraços!
Me envolva antes da pálida e doente luz da lua tirar o róseo da minha face...
Me aqueça antes da brisa que carrega as estrelas estremecer minhas mãos...

Sentiria mil vezes sua falta, se a noite partisse e me levasse com ela!
Mas ainda assim, sinto ainda mais o fulgor do desejo, a ansia pela noite...
Que o trás para mim em meio a escuridão, repudiam os raios do dia.
Leve embora toda luz do sol e calor dos dias, leve contigo e pernoite.

Me sussurre pela milésima vez meu nome e grite seus anseios,
cale a cotovia, cale o rouxinol, a coruja e o galo da manhã.
Despedace os dias de minha face e preencha meus olhos com a escuridão,
me dispa do calor do sol, o tédio do cotidiano... Sã? Que é sã?

Sentirei sua falta mil vezes, velarei mil noites, meu pesar descendo junto ao sol.
Mas até que esse dia chegue, cubra-me os ombros do frio,
arranque o sangue de meu peito e o amor de meu coração.
Que o dia queime suas lembranças, marcando a fogo o que passou.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

May I Ask?

What's bothering you?
Can't you tell me already?
I thought it over, it's true,
and you should be ready.

Just face it like a man,
May I ask you that?

Pain and pleasure, come in a mix.
Taste it, spit it, swallow it up.
Eyes, lips, neck, hands and hips,
turning around, breaking it up.

Just take it like a man,
May I tell you that?

Pain and pleasure, you couldn't resist.
Hurt me, tease me, nurse me, kiss me.
Can't have enough out of all this.
Can't understand, but still you believe.

What's wrong?
What's up, with you?
Be strong,
Blink and it's through.

And even though it never ends,
It's always spinning, growing backwards.
It would be easier to pretend,
but I just can't wait till afterwards.

Taste it, spill it, swallow it up.
Hurt me, tease me, nurse me, kiss me.
Drink me full, then fill my cup.
May I ask you to try out and see?

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Quer? Quer mesmo?

Entrar na minha mente,
é um caminho sem volta.
Sentir o que a gente sente,
nesse corpo é só uma amostra.

Vem mais perto, mais pra dentro,
sem saber onde, como, se perdendo.
Se quer tanto assim saber o que penso.

Vestir toda minha pele,
pra saber o que me toca.
Saber o que a gente sabe,
nesses enigmas sem resposta.

Fica mais perto, fica mais tempo,
sem saber onde, como, se perdendo.
Quer tanto assim sentir? Quer mesmo?

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Palavras à parte

-Hmnn... o que é isso?
-Lê.
-.... Bonitinho...
-Continua lendo...
-Ele fez o que?!
-Bonitinho né?
-ELE...ele...ele...
-Vem cá?
-O que você vai fazer?
-Transformar ficção em realidade, lógico!

.... algum tempo depois...

-Monstro....
-Vai dizer que não gostou?
-...
-Quer que eu leia uma história pra você?
-NÃO!

terça-feira, 23 de junho de 2009

Premonição

Se você soubesse tudo antes,
faria tudo ao contrário
Ou deixava como estava?

Se enxergasse os mais distantes
acontecimendos, seria páreo
para o que se desvendava?

Poderia dizer que já sabia,
mas isso não importa mais.
A premonição é minha,
e se realiza, não importa o que faço,
ou o que você tenta e faz.

terça-feira, 16 de junho de 2009

Trust - Megadeth

Lost in a dream
Perdido num sonho
Nothing is what it seems
Nada é o que parece
Searching my head
Procurando na mente
For the words that you said
Pelas palavras que disseste

Tears filled my eyes
Lágrimas encheram meus olhos
As we said our last goodbyes
Enquanto dissemos o último adeus
This sad scene replays
Essa cena triste se repete
Of you walking away
De você indo embora

My body aches from mistakes
Meu corpo dói de erros
Betrayed by lust
Traído pela luxúria
We lied to each other so much
Nós mentimos tanto um para o outro
That in nothing we trust
Que em nada nós confiamos

Time and again
Agora e de novo
She repeats let's be friends
Ela repete: vamos ser amigos
I smile and say yes
Eu sorrio e digo que sim
Another truth bends
Outra verdade se curva
I must confess
Eu confesso

I try to let go, but I know We'll never end 'til we're dust
Eu tento deixar pra lá, mas eu sei que não vamos acabar até sermos pó
We lied to each other again But I wish I could trust
Nós mentimos um para o outro de novo, mas eu queria poder confiar

God help me please, on my knees
Deus me ajude, por favor, estou de joelhos
Betrayed by lust
Traído pela luxúria
We lied to each other so much
Nós mentimos tanto um para o outro
Now there's nothing we trust
Agora não acreditamos em nada

'How could this be happening to me
Como pode isso estar acontecedo comigo?
I'm lying when I say "trust me"
Estou mentindo quando digo "confie em mim"
I can't believe this is true
Eu não acredito que isso é verdade
Trust hurts
Confiança dói
Why does trust equal suffering'
Por que confiança é igual sofrimento?
Absolutely nothing we trust !
Absolutamente em nada confiamos

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Blush

Será que sua mãe está sabendo,
as coisas que você anda fazendo?
E se ela soubesse, o que diria?
Mandava você correr pra casa,
ou será que deixava ficar na minha?

E se o seu pai também soubesse,
não importa nada, vê se esquece.
Diria com orgulho, é filho meu,
ou se manteria no canto calado.
Sabendo o que você não perdeu.

De qualquer jeito, eu sei melhor,
melhor que ninguém, quando só,
o que você andou fazendo.

E quando acompanhada, ainda mais,
e a gente pode dizer que tanto faz,
o que estamos fazendo.

Desde que as luzes estejam apagadas,
desde que a porta esteja trancada.
E mais ninguém esteja vendo.

domingo, 14 de junho de 2009

Ritmo

Eu posso acompanhar seu ritmo,
se eu quiser dançar a sua dança.
Mas o pulso de desejos, infimo,
não satisfaz essa ganância.

Porque depois de chegar ao fim,
do famigerado arco-iris do duende.
Não há ouro, nem mais aventura.
Será que você me compreende?

Eu posso sentir as duas mãos,
e o afiado dos seus dentes.
Podendo ouvir o que não disse,
entendo, mas será que me entende?

Não se trata do que eu posso fazer,
muitas vezes nem mesmo do que quero.
Apenas do que devo fazer, ou temer...
Entenda, perdoe, eu espero...

sábado, 13 de junho de 2009

Flavor

Get your hands on mine...
Crossing fingers, hold on tight...
Get your hands on me...
Sliping, rubing, press on right....

Catch your breath,
feel my chest beat.
Catch your breath,
does it taste sweet?

Taste me, flavorless...
Taste me, shameless...
Try me one more time...

Reach me, emotionless...
Reach me, doubtless..
Try me one more time...

Get your hands on me,
catch your breath.
Taste me, try me,
all so sweet.

Risca

Risque meu nome da sua lista,
nada de cartas, presentes ou cartões.
Nada de convites para festas,
você sabe que eu odeio multidões.

Preste atenção nas fronteiras,
fique sempre do seu lado da mesa.
Não me faça ter que caçá-lo,
dentro ou fora, da na mesma.

Se divida em dois, três, quatro,
siga suas próprias regras, à risca.
Mas não tente entrar no meu quarto.
Possessão, obsessiva, pessimista.

Uma vez que se atravessa a linha,
não da pra voltar atrás.

Uma vez que já foste minha,
que diferença isso faz?

Quer apostar?
Chega mais.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Me peça pra ficar...

O que eu poderia dizer?
Se não, que eu já me vou.
E não adianta pedir pra parar,
quando estou em pleno voo.

E eu já não posso parar.
Depois de quebrar o vidro,
a queda livre me envolve.
Seu desejo é repelido.

Não me peça, por favor,
Coisas que eu não posso fazer.
Lutar contra gravidade,
ou pedir autografos pra um E.T.

E não me peça também, por favor,
pra esperar, ficar quieta e esquecer.
Que o nosso tempo já passou.
Isso eu não posso fazer.

Não me peça pra reconsiderar,
não há mais lugar na sua cama.
E não adianta gritar:
eu sei que você me ama.

E não me peça pra ficar,
Não há espaço nos seus braços.
Amor não tem mais nada,
nada, a ver com tudo isso.

O que eu poderia dizer?
Eu sei, sei que você me ama.
Mas o que isso tem a ver,
com o outro nome que te chama?

Bittersweet valentine’s

Taste the chocolate from my lips,
My distasteful valentine’s.
Alone in the dark, gives me shivers,
But time fastly goes by.

Wrap yourself up,
You’ve never been so sweet.

Give yourself up,
And I may be your treat.

Golden cherubins staring at me,
Just because I use a shotgun.
I don’t play fair, but today
Maybe you will forgive it.

Because I already tasted before,
The bitter loneliness of today.
And I am sick of schewing flowers,
Ripping letters and wasting Fridays.

All I want is sugar and candy,
Filling up my flavorless days.
And maybe someone to share it,
My bittersweet, valentine holyday.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Contramão

É díficil despedir-me,
quando o que mais quero,
está parado diante de mim.

É dificil decidir-me,
quando o que eu quero...
Melhor eu nem pensar assim.

Porque cada passo dado,
vai na direção errada,
ou na direção contrária.

Porque assim que me calo,
lembro o que devia dizer,
tarde demais pra lhe responder.

O que você quer que eu diga?
Me diz, porque já não sei.
O que você quer que eu faça?
Me ensina, antes eu já errei.

E eu sei que vou me arrepender,
eu sei exatamente o que te faz sofrer.
Mas de qualquer jeito, vai ser assim.
Porque já cansei de não fazer,
o que quero e você quer de mim.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Whatever

Bending the truth,
to something you like.
Squeezing it through,
so won't slip a lie.

All to fit your taste,
my shap little tongue.
Only so we won't waste
any time, would be too long.

Does it fit you right?
My words? Marked cards.
Does it make you smile?
My truth, cloth and masks.

Rip off my veil, and go blur my sight.
Take off my mantle, you want, you might...
So I will only be, see, say, do, think...
Whatever you want from me.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Noites silenciosas e contos de fadas

No ritmo eletronizado da lira,
criada com cordas de guitarra.
Para espantar o silêncio daqui,
balançar e fazer o chão ruir.

Eu posso ouvir até o vento,
cadência da sua respiração.
Eu posso ouvir minha pele,
encolhendo sob essa pressão.

E ainda assim estrelas brilham,
como seus olhos no escuro.
Cadentes em desejos despejados,
que eu colho e sussurro.

Sussuro por dentro dos seus lábios,
meu último encantamento.
Que mesmo que só no momento,
é o final feliz do conto de fadas.

E eu só pra romper o silêncio,
o faria gemer e gritar,
nem que de fada a bruxa,
tivesse que me transformar.

Porque a noite nos envolve,
e o escuro silencioso consome,
cada pensamento bom em mim,
os trocando por todas as histórias,
que não se contam depois do "fim".

domingo, 31 de maio de 2009

Rouge c'est rosé.

Bebendo das minhas coxas,
toda festa fica mais divertida.
Se quiser um sabor doce,
é só parar de lamber feridas.

Suas mãos são pegajosas,
e a luz vermelha me cega.
Mas uma pilula depois,
garota nenhuma o nega.

Venha brincar no escuro,
o rosa da lampada queimando.
E se por dentro decomponho,
por fora estou vibrando.

O vermelho é cor de rosa,
você só precisa beber o bastante.
A vida dura é muito simples,
num piscar de olhos, um instante.

O que você quiser,
quando quiser...

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Vento levar

Eu só quero dormir na areia,
antes que a maré venha me cobrir.
Só quero olhar as estrelas,
antes de chegar a hora de partir.

E se esses grãos asperos,
apagarem minhas palavras.
Não há nada mais normal.

E se esses focos de luz,
cegarem minhas memórias.
Talvez não seja de todo mal.

Por que tudo que eu quero,
é esperar o tempo passar.
Enquanto decido se vou,
se fico e qual meu lugar.

E se você seguir meus passos,
tentando esclarecer o que passou.
Não diga nada, não quero ouvir,
já sei, já ouvi, já falei e me vou.

Deixando contigo meus versos,
palavras que as ondas vão levar.
E um último sorriso, que beija
seus olhos e pede sem querer...
Não deixa o vento me levar.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Sai da minha vida

Nós somos muito feios,
mas a foto está bonita.
Você, eu, nossos amigos,
só faço merda nessa vida.

Eu já não o suporto,
essa sua cara desentendida.
Não sei como me aguenta
e ainda me chama de querida.

A verdade é que não há mais,
nada a perder.
A verdade é que não há mais,
ninguém pra querer.

O que é pior que suas manias?
E meu Deus! Você me irrita!
O que é pior que minhas manias?
Essa repetição não te irrita?

Por que não me manda pro inferno?
Vê se me tira da sua vida!
Mas a verdade é que não quero,
mais ninguém na minha vida.

Seus olhos quadrados,
cabelo desleixado.
Meus quadris largos,
lábios rachados.

Somos muito feios,
mas a foto está bonita.
E eu não quero mais ninguém...
Você sozinho já me têm,
e toda hora me irrita!

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Heat

Should I? Should I?
Put down my legs,
touch the ground.
If so, tell me why!

Why should I? Should I?
Be different while here,
confortable with me.
If I should tell me why.

Should I shut my lips,
masquarade my thoughts.
Pretend to be someone,
with no shuckels or leash.

Pretend not to lash your heart,
Should I be punished or part?
Should I behave? Tell me why!
Tell me why, why should I?

Why not scratch your back,
why not take what I lack.
Why not hold you down,
why not moan and howl.

Why should I turn to ice?
Lust comes with a high price.
Why should I stop the heat?
If again, and again, it get's so sweet...

sábado, 23 de maio de 2009

Heartless

Eu sou, desde aquele momento, incapaz de sustentar minha própria vida. O sangue que corre em minhas veias é bombeado pela força do coração de outro alguém, despejado em minhas mãos e consumido pelos meus lábios. Ao primeiro gosto de sangue, e a dolorosa sensação do músculo que volta a trabalhar, me lembram do gosto nauseante e da sensação perturbadora que é a continuidade da vida.
A cicatriz profunda em meu peito marca o dia, em que depois de esfaqueada ouvia claramente dizer: seu coração a mim pertence, portanto o meu pertencerá a você! O gosto em meus lábios e a substituição do frio pela dor, trouxeram à tona a sensação pulsante e a desesperadora realidade de meu amante morto aos meus pés. Mas um coração arrancado não bate por muito tempo, sua força se perde descendo pela garganta.
-Bruxa!
-Sua sem coração!
Sem coração, sem coração. Que posso eu fazer se não provar de outros? Se não tomar a força daqueles que batem fortes... Apenas morrer... E eu não quero morrer, mesmo depois de ter vivido tanto tempo, com esse gosto e essa dor. Ainda assim, agindo como se nada sentisse e tudo que quisesse era mais um peito sadio para partir e devorar, ainda assim meus olhos se perdem pela janela.
-Meu amor, meu amor, meu amor...
E nas mil vezes que sussurrei, ouvi apenas o eco da minha própria voz. E não há quem possa me dizer se um dia ouvirei resposta, se algum outro dia, algum outro alguém, me daria voluntariamente seu coração repleto de sentimentos, sorrindo para mim. Sem pedir nada em troca, mesmo porque... Debaixo dessa cicatriz profunda, atrás dos lábios envenenados, já não há mais nada que eu possa dar.

O caminho do Sol

E depois que as horas correrem,
e as sombras mudarem de lugar.
A despedida, que enceno: au revoir.
Olhe para o horizonte que encerrem.

Mais um dia que corre, sol que se põe.
Mais uma hora que passa e terminou.
E vendo no meu braço que agarrou,
sua imagem que se perde e dispõe.

Pedindo para não acabar ou partir,
não encerrar nem num aceno sorrir.
Não me deixar, sair de perto daqui,
não perder o calor que vem de ti.

Como se não soubesse, que bem aqui,
está a que mais odeia partir.
Mas o caminho do sol segue,
e mesmo que queira permanecer,
até o novo despontar... Parti.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Compacto letal

Na vertigem eu encolho,
eu fico febriel, eu enjoo.
Deixando a náusea ficar,
viro pro lado, sem saber chorar.

Sem saber reclamar, não para,
sem saber tratar, não sara.
E caminhando rolando,
caindo e desmanchando.

Numa forma compacta de mim,
que com pontadas se contorse,
escorrego me perdendo, enfim,
numa doença que não mata,
mas também não morre.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Sangre comigo

Todos os seus erros,
pequenas gafes cometidas.
Irão ruborizar minha face,
de maneiras desmedidas.

Aquele corte de papel doeu,
assim como aquela queda,
assim como aquele adeus.
Mais em você? Ou eu?

Toda vez que me cortar,
toda vez que se cortar,
duas cores se misturam,
sangrando comigo está.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Miséria dos Carentes

Todos os erros enaltecidos,
pelas lágrimas que vertem.
Todas as dores e os gemidos,
se somam e se convertem.

Naquele velho grito,
pedinte e miserável,
sofrido e detestável.
Carente de atenção.

Naquela velha história,
de cicatrizes maquiadas,
de tragédias ensaiadas.
Que não aconteseria se não...

Se não quisesse tanto as dores,
quisesse tanto as mágoas,
só para receber ardores,
abraços e copos cheios d'águas.

Bem mais doces do que o normal,
bem mais atenciosos que o normal.
Atenção que só é dada aos miseráveis,
Tão carentes de algo mais, afáveis,
mesmo que nada disso seja real.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Se me faz

Um dia meus olhos estavam,
fixos no chão que pisava.
E mais tarde acima imploravam,
ao pé que me amassava.

Se me faz tão mau assim,
por que não me sinto tão mal?
Se me faz sofrer assim,
por que parece-me tao normal?

O que em você me machuca,
segundos depois me faz sorrir.
O que, o que, o que? Retruca,
sem me tornar qualquer martir.

Se me faz tão mal, se me faz
como sou. O que? O que sou?
Por que esse mal só me trás,
motivos parar rir de tudo,
que aconteceu, doeu, passou...

sábado, 2 de maio de 2009

Amor de vidro e papel

Eu lhe dei flores de papel,
para que pudesse amassá-las.
Dei sentimentos de vidro,
para que pudesse quebrá-los.

Essas flores cortaram seus dedos,
que mais tarde eu lamberia?
Esses sentimentos feriram seu corpo,
que mais tarde eu beijaria?

É porque sinceramente,
por trás do vidro e do papel.
Eu mordo e assopro, em seus ouvidos.
Meu sentimento mais cruel.

Meu amor, que corta, que fere,
amassado e quebrado. E espere!
Que lambe e que beija, que morde,
que assopra. E que você como é,
mesmo que queira, não negue.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Did I/ Eu fiz?

Did I make you cry?
Did you ask me why?
All the things I hate about you can just die.

Never sign up for Angel,
never agreed to be in hell.
But still you lay beside me, too afraid to yell.

Did I make you cry?
Did you ask me why?
Because I long for the day, when I will die.
And nobody else will ever make you cry.

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Eu a fiz chorar?
Você perguntou porque?
Tudo que odeio em você pode morrer.

Nunca me inscrevi pra Anjo,
nunca concordei em ficar no Inferno.
Mas ainda está deitada ao meu lado, com medo demais pra gritar.

Eu a fiz chorar?
Você perguntou por que?
Porque anseio pelo dia que irei morrer.
E ninguém nunca mais a fará chorar.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Será que eu... Posso...

-Será que eu... posso ficar com você?
-Está com medo do escuro?
-Não é isso...
-Teve um pesadelo?
-NÃO É NADA ISSO!
Será que eu posso? Ficar com você? Por que toda noite é a mesma coisa, todos se deitam em suas camas e fecham os olhos para fugir da realidade, mas os meus ficam abertos. E a cada respiração, eu sinto meu coração encolher e expandir, eu posso sentir meu sangue correndo e minhas mãos tremendo, puxando os lençóis. Todos os dias eu ando encolhida, eu olho para o chão, mas quando você está por perto... Eu consigo descansar e até sorrir.
-Me desculpe, você não parece muito bem...
-Não encosta em mim...
Será que você não percebeu, que qualquer toque seu, como agora na minha mão, esse olhar sobre mim... Só isso é o suficiente para me deixar indefesa. O meu corpo inteiro se solta, como quem se entrega ou desiste, mas você nem nota, ou é simplesmente cruel. Sorrindo pra mim, me puxando pra perto e fazendo carinho nos meus cabelos, dizendo que está tudo bem. Mas não está.
-Por favor... Não....
-Está bem... Mas você não queria ficar aqui?
-Por que?
-Por que? O que?
-Você me deixa desse jeito, por que?!
-Me desculpa, eu não queria fazer você chorar...
Mas você faz, faz cada parte de mim doer, cada vez que desvia os olhos. E eu só queria saber, se eu posso ficar com você. Por que do seu lado é morno e gentil, porque do seu lado eu consigo dormir, porque do seu lado... É um motivo a menos para chorar. Se os seus braços continuarem me envolvendo, eu não sei até quando o meu corpo vai existir, ou se ele vai simplesmente desaparecer nos seus braços, só para que cada cinza, cada suspiro que restar de mim, possa ser levado com o vento, para um lugar que eu não sinta sua falta. Mas os meus dedos se agarram a sua roupa, tentando me segurar aqui. Por que tudo que eu quero saber é... Se eu posso ficar com você.

Seu

Se eu posso ser sua,
Não há razão pra ser mais nada.
Se faço o que gosta,
Nunca me sentiria envergonhada.

Não é que não tenha vontade,
É que ela não me pertence.
Se não me entende de verdade,
Apenas pare e pense.

Quando foi que me viu sorrir?
Alguma vez eu já chorei?
Quando meu corpo se partir,
Acha que eu o deixarei?

Se me comportei mal,
Aceito qualquer punição.
Mas saiba que é bem normal,
Eu obedecer, eu entregar,
Eu esquecer... minha própria razão.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Num vidro


Como um inseto no vidro
Brigando com a própria imagem.
Se sentido pouco a vontade,
No espaço tão restrito.


Se debatendo bravamente,
Tão descontroladamente.
Não sabe que é em vão?
Se esmagar com sua mão.


Como um inseto no vidro,
Ferindo a si próprio então.
Sem aviso de antemão,
Que seu tempo é restrito.


Pois o ar se perde, ruidos calam,
E as forças se esmigalham.
Nas pancadas furiosas no teto,
Na parede e no próprio inseto.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Drifting

À deriva num mar de memórias,
Sem sinal de uma praia qualquer.
Tudo que resta são velhas histórias,
De tempos que ou se tem ou se quer.

Seus tempos, montanhas altas.
Suas memórias, vales profundos.
Coisas básicas, o que me falta.
Trilhas perdidas de um velho lobo.

Embarcação sem vela ou rumo,
Vagando pela noite eterna.
Sorriso breve, olhar soturno,
Suspiros escorados na janela.

Tudo que resta, caminhos invisiveis,
Que se embrenham entre outras rotas,
Outras naus, outros indizíveis.
Juntando rotas, que se afastam tortas.

Poderia cruzar, vidas, memórias,
Poderia compartilhar os sentidos.
Mas ainda assim se acaba,
À deriva, vagando sozinho.

sábado, 28 de março de 2009

Proximidade

Como eu adoro a fúria,
inscrita nos seus olhos.
E a distante bruma,
que separa nossos corpos.

Mas como eu sinto falta,
daqueles que empurro:
Das pontes mais altas,
depois erguendo muros.

Se me odiar tanto melhor,
mas que bom que me ama.
Se eu o afastar tanto melhor,
mas que bom que minha voz...
Indecisa voz, ainda o chama.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Queda

No precipcio do tempo
fez questão de agarrar-me,
as mãos incertas contendo,
minha queda e partida.

Então no giro do tempo,
me soltou no abismo.
Assim já não entendo,
aonde me quer na sua vida.

domingo, 22 de março de 2009

Mudanças de Curso

IV

-Então é a vez do Valete? – Katana murmurou, antes venha aqui garoto.
-Algum problema? – Valete perguntou caminhando até a mulher.
-Me dê sua mão...
Katana rasgou um pedaço do próprio Kimono para estancar o corte na mão de Valete, ela tinha um fraco por heróis de donzelas. Fora assim que se apaixonara por Ás, ele a salvara uma vez de um agressor, dali em diante não tinha mais volta de seus sentimentos. Valete agradeceu com um sorriso, abriu e fechou a mão algumas vezes como quem testa os movimentos depois deu um pulo para trás animado. Deu risada da ironia de lutar com a mão machucada como Dama fizera, piscou um olho para a garota que retrucou com uma careta.
-Quem vai ser?
-.... – Ninjato se moveu antes de Sabre, o baixinho parecia ter gostado da velocidade do oponente.
-Eu não gosto de lutas, então vamos acabar logo com isso, está bem? – Valete sugeriu tentando tirar a franja do rosto.
-Como alguém que não gosta de lutas se uniu ao Nocaute? – Sabre murmurou confuso.
-Eu também não entendo... – Dama murmurou abraçada às próprias pernas.
-Ele e o irmão costumavam ser arruaceiros, brigavam todos os dias por diversão. Foi assim que o Valete aprendeu a lutar...
O Ás podia saber a introdução, mas a história real era muito maior que aquilo, como muitos outros gêmeos ele era muito apegado ao irmão, dividiam os acertos, erros e a baderna como uma pessoa só. Eles eram muito bons em brigar, especialmente porque um protegia a retaguarda do outro, eram inseparáveis e competentes quando estavam juntos, mas ninguém fica junto para sempre. Por mais que fossem gêmeos, não eram a mesma pessoa para ter a mesma vida ou morte.
-Irmão, não são os caras de ontem...? – ele perguntou apontando um bando de garotos na esquina, pareciam esperar.
-Ben, vá para casa... – o outro mandou.
-O que? Nós dois podemos...
-Vá logo! – o irmão retrucou o empurrando no chão. – ANDA!
Os gritos chamaram a atenção do grupo, mas ele não correu, não conseguia sequer pensar em deixar o irmão sozinho contra aquele bando. Seu irmão tentou o proteger, acabou sendo o que mais apanhou, lembrava de mal conseguir ver com os olhos inchados quando ouviu o estalar de ossos quebrando, mesmo depois que não se mexia mais, continuaram chutando seu irmão. Até que alguém apareceu. Talvez tenha sido a única coisa que os impediu de ter a mesma vida e morte, talvez era isso que alguns chamavam de encruzilhada.
-Covardes não merecem piedade.
Foi assim que Valete conheceu o Nocaute, Rei em particular. Não era o irmão mais velho que morreu numa briga idiota, mas por algum motivo se davam bem. Ele nunca mais puxou brigas, apenas as apartava e quando necessário se defendia, ao mesmo tempo queria ser mais forte. Imaginava que se fosse mais forte, seu irmão não teria morrido daquele jeito, completamente arrebentado. Dama nunca tinha visto o Valete lutar, mas parecia apenas fugir como ela, com a diferença que era muito mais rápido e Ninjato usava duas espadas! Nem imaginava que o loiro sorridente poderia ser tão bom assim em evitar brigas, coisa que fizera desde que o irmão morreu.
-Se continuar assim ele vai...
-Ganhar. – Rei cortou a frase da garota.
-Mas, Rei....
-O Valete tem seu próprio jeito de resolver as coisas, ele não gosta de lutas, então quando tem que lutar geralmente dá um golpe só.
Um golpe só... Ela não entendeu no começo, mas conseguiu ver melhor quando depois de cruzar as espadas e abrir a guarda Ninjato deu o espaço perfeito para um golpe certeiro, Valete fechou os dois punhos um ao lado do outro e acertou em cheio do coração do nanico que saiu voando como se fosse uma bola de volei que acabara de receber um corte. Ninjato não levantou, tossiu algumas vezes e tremeu ainda no chão e depois perdeu a consciência, Florete foi ter certeza de que ia ficar tudo bem. Parado na posição do soco, Dama podia ver claramente os musculos que ele exercitava todos os dias.
-Pensei que não gostasse de lutas... – Katana murmurou encarando o jovem, Florete fez sinal de que o baixinho ia viver.
-Se eu pudesse voltar o tempo, Katana, eu teria passado a vida inteira sem dar um soco sequer. Mas agora já é tarde demais para escolher uma vida pacifista completa. – Valete falou puxando o nó do tecido em sua mão. – Muito obrigado.
-Todos tem um motivo para lutar... – ela falou isso praticamente para si própria.
O fato era que ela não lembrava porque começou a lutar, pegou de volta o pedaço de Kimono sentindo o cheiro de sangue nele, assistindo Valete sorrir enquanto se afastava, mas parecia perturbado. Katana quase pôde ver nos olhos dele o irmão morrendo na cama do hospital ao lado da sua. Ainda assim havia motivos para lutar, motivos para ser forte e motivos para... Do que estava tentando se convencer? Sabre notou o olhar consternado de sua chefe e se levantou se adiantando.
-Vou acabar com isso, Katana. – ele prometeu.
-Sabre... – ela murmurou saindo de seus pensamentos.
-Vem logo... Rei. – Sabre chamou puxando sua espada.
-Basta! – Katana falou se levantando - Cancelo as lutas, vão embora!
-Katana...
-Agora! – ela gritou e Ás chamou suas cartas. – Saíam do meu território...
-Com licença... – Ás pediu ao sair.
Katana não os olhou, deu as costas para os visitantes que partiam, Florete notou o estado debilitado da mente de sua lider, entendia bem as nuances de uma mulher perturbada. Sabre não fazia idéia do que estava acontecendo e quando se aproximou dizendo que teria ganho facilmente ela o acertou em cheio com a bainha de sua espada. O encarou por um momento com os olhos finos o dissecando, ele soube que ela poderia matá-lo por dizer a coisa errada naquele momento, entao apenas baixou o rosto em submissão.
-Florete, leve Ninjato ao hospital... – ela mandou abaixando sua espada. – Sabre.
-Sim, Katana?
-Nunca mais me questione... – ela murmurou o vendo levantar-se devagar ainda de cabeça baixa. – Entendido?
-Sim.
-Eu sei muito bem do que você é capaz e do que você não é... – ela falou tocando o rosto dele com um sorriso. – Mas eu lhe asseguro. Não preciso de você para defender minha honra.
-Sim, Katana... – ele a assistiu ir embora, como uma miragem o deixando para morrer de cede no deserto, apenas quando sabia que ela não podia mais ouvir murmurou – Meu amor...
Não se pode brincar com lâminas afiadas, mais cedo ou mais tarde acaba-se cortando a si próprio e então é tarde demais. O Clube das Espadas surgiu para dissecar as vontades e habilidades de cada um, surgiu porque ela precisava arrancar com sua lâmina o que quer que ainda houvesse de Ás dentro de si, mas nunca conseguira. As cicatrizes se amontoaram e sua lâmina mudou de cor, mas era impossivel retirar a vergonha e a tristeza que a envenenavam. Só restava uma coisa para fazer e sabia muito bem o que era, assim que Ninjato voltasse do hospital, iria deixar aquele Clube, aquela gangue, para sempre.
-Você sempre me exila, Ás... – ela murmurou abraçando a espada.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Importância

Talvez eu sinta sua falta,
Por isso relembre tanto,
Todas suas palavras.
Talvez nem tanto.

Talvez eu o tenha amado,
Por isso relacione tanto,
O que vejo com seu retrato.
Ou Talvez nem tanto.

Se eu tivesse entendido,
Que não quer dizer falta,
Nem amor pouco ou tanto.

Que simplesmente dito:
Adeus. Não há mais volta.
E então não importa tanto.

Fraqueza

III
A história do Clube das Espadas é interligada a do Nocaute Deck, a fundadora e líder da gangue, Katana, tinha uma queda abismal por Ás durante muito tempo, mas suas ideologias eram diferentes. No Nocaute Deck eram permitidas no máximo armas contundentes, mas prevalecia a luta corporal, por isso eles se separaram e ela fundou o Clube das Espadas sob o nome de Katana. Funciona como outras gangues, fazem serviços para gente sem escrupulos, comandam um bairro inteiro, se metem em brigas e cobram impostos pela segurança local. Ninguém sabia exatamente o que Ás sentia pela mulher, mas todos sabiam que havia muito mais do que ouviram falar.
-Então vocês foram surrados por uma pessoa só? Só pode ter sido alguém do Nocaute, vocês estavam muito perto do galpão deles. – Katana murmurou, os olhos puxados encarando os três garotos. – Foi muita idiotice de vocês e até mereceram, mas não posso deixar isso assim, afinal vai parecer uma fraqueza de todos nós.
-Eu sinto muito, Katana! Nós vamos pegar aquele cara e acabar com ele!
-Até parece, vocês iam ser espancados de novo. – era Sabre quem comentava, usava um terno que lembrava os da nobreza em séculos passados na época da cavalaria. – Eu devo fazer algo, Katana?
-Não, Sabre... – a mulher falou levando a manga do kimono até a frente do rosto, era um hábito que tinha ao pensar. – Antes quero ter certeza de que foi alguém do Nocaute.
Ela falou se levantando, os cabelos esvoaçavam ao vento, tinha uma presença um tanto quanto romântica para aqueles que nunca a viram em ação. Sabre tivera o prazer, o prazer de ver os olhos estreitos dela acharem o local exato, abrirem uma fenda e fazer voar sangue em seu rosto. Ela sempre carregava sua katana consigo, mas raramente a desembainhava, geralmente uma ou duas porradas com ela guardada já era o bastante para fazer-se ouvida.
-Senhora Katana! – era a voz de florete vindo da entrada, justo quando ela iria se retirar aos seus aposentos. – Temos visitas!
-Quem?
-Ás, do Nocaute Deck. – o rapaz gritou. – E três outros...
-Convide-os a entrar. – Ela falou voltando a se sentar, ia ser uma tarde longa pelo visto, não restavam mais dúvidas.
-Você!
Claro que a vítima é a primeira a apontar o culpado, não foi dificil reconhecer Dama e apontar na direção dela, estava logo atrás de Ás, entre Rei e Valete. Katana meramente colocou sua espada de lado e fez um gesto de saudação com a cabeça, Sabre e Florete ficaram ao lado dela como guarda costas e os espancados, bem, foram empurrados para o lado enquanto os visitantes paravam na frente da líder. Por um momento o silêncio marcou o lugar, Katana não podia evitar olhar para Ás e pensar que ele continuava o mesmo homem que ela amou, mas que agora era seu inimigo, a honra de seu grupo tinha sido atacada, por mais que os três garotos fossem mais peões do que peças importantes de sua estratégia.
-O que os trás aqui, Ás? – ela perguntou, a mão não deixava a espada, o kimono azul deixava seu rosto mais pálido.
-Os seus rapazes... – ele indicou os três garotos surrados – Tiveram um certo desentendimento com uma de minhas cartas e eu vim resolver isso, antes que se torne um problema, de maneira amigável e respeitosa. Você devia manter seu pessoal longe do meu galpão...
-Você entende que não posso deixar isso passar em branco? Eu entendo que eles andaram um pouco demais, mas foi sua carta que os machucou e não o contrário...
-Entendo. – Ás olhou de leve para Dama que apenas soltou um longo suspiro como quem está entediado - Alguma sugestão?
-Estes são suas cartas reais? – ela perguntou analisando os três. – Façamos um duelo então, mano-a-mano, entre nossos três melhores. Garoto... Vá chamar Ninjato. Os perdedores ficam sob as ordens dos vencedores.
-Entendo, a desvantagem nas armas é provinda da ofensa de mais cedo. – Ás murmurou contemplando a situação.
-De maneira alguma, se quiserem podem usar armas brancas, mas entendo que não faça parte do estilo do Nocaute Deck. – ela comentou levanto a manga do kimono até a frente do rosto. – Ou os tempos mudaram?
-Os tempos sempre mudam, pessoas é que são teimosas.
-Chefe... – Dama murmurou se levantando – Eu vou primeiro. E senhora, Katana...Sinto muito por tê-la ofendido, mas eu não me arrependo de ter surrado aqueles idiotas covardes. Você devia escolher melhor seus subordinados...
-Eles terão sua punição no devido tempo. – a mulher respondeu. – Florete...
Foi aberto espaço do salão, de um lado Katana e Sabre, na parede oposta Ás, Rei e Valete, todos admiravam Florete com sua espada de esgrima afiada e Dama que estalava os dedos, nunca tinha lutado com alguém armado antes, com exceção de um bêbado com uma garrafa, parecia complicado. Ele era uma versão estranha de um esgrimista, a regata justa e os longos cabelos castanhos com caixos presos por uma fita, usava luvas brancas que pareciam não ter real utilidade, ela só tinha suas roupas, o boné e as ataduras em suas mãos.
-Isso são ferimentos? – ele perguntou puxando a espada.
-Não é nada...
-Vou ser gentil. – ele prometeu com um sorriso.
Começou antes do que ela podia imaginar, seu boné foi jogado longe quando só deve tempo de pular para trás, estava acostumado com brutos entre outras coisas, mas Florete era rápido e deveras gracioso em seus movimentos. Ela só podia fugir, não conseguia chegar perto para um soco e o barulho da espada fina cortando o ar a deixava preocupada. O primeiro golpe veio como uma picata de abelha, aqueceu a pele e doeu, mas era mais incômodo do que qualquer outra coisa, um corte na altura do ombro. Parecia um souvenir ou um cumprimento.
-Interessante. – Sabre murmurou para Katana. – É a primeira pessoa que sequer mudou de expressão depois de cortada por ele.
-Você sabe como ele é com mulheres... – ela sorriu em resposta.
Florete também notou, não era qualquer um na sua frente, o rosto sério e concentrado não mudou, como se nem tivesse sentido a lâmina agora manchada de sua arma, aquilo o desconcentrou, a deixou chegar perto o bastante para um chute que ele bloqueou com um braço enquanto o outro a tentou cortar de cima para baixo, mas cortou apenas o enorme agasalho. Ela já ia correr de volta para atacá-lo quando ele guardou a espada, sentindo algo estranho se revirando dentro de si.
-Eu me rendo. – ele anunciou com uma mesura.
-O que? – ela não entendeu parada no meio do movimento.
-Perdão, mileide. – Florete falou com mais uma mesura – Se tivesse me avisado antes talvez seria diferente, mas é incrivelmente rude lutar tão desigualmente com uma dama, ele podia ver claramente pelos punhos dela que haviam cortes abertos e não era só isso, desde que ele cortara a blusa deixando mais evidente que ela era uma garota, ela parecia ter se desconcentrado também.
-Que hora pra ser cavalheiro. – Sabre resmungou baixando o rosto, mas na verdade tinha vontade de rir.
-...Desigualmente? – ela repetiu rangendo os dentes, acabou de arrancar a blusa e jogou para trás.
-Ela vai pirar de novo, não é? – Valete comentou com um sorriso nervoso.
-As regras são as mesmas... – ela virou a aba do boné para trás – Não me venha com cavalheirismo agora, eu não estou interessada! Pega de volta sua espada!
-Você não está entendendo sua situação? – ele perguntou espantado.
-Não interessa a situação. – ela falou erguendo o punho, parecia ter voltado ao foco e estar muito brava – Só preciso te acertar uma vez direito e essa espada de brinquedo não vai te ajudar mais.
-Perdão pela ofensa, mileide. – ele falou vendo a fúria nos olhos dela, sentiu vontade de sorrir, mas não queria ofendê-la de novo – Como quiser...
Não demorou nada, afinal de contas Florete era rápido, ela não conseguiu o acertar do jeito certo, apensar dele ter ganho um roxo na perna e outro na cara, ela chegou perto demais e ele colocou a ponta da lâmina em seu pescoço. Acabou. Simples assim, mas ele sorriu e falou que ela era espirituosa o bastante para que respeitasse aquela partida, talvez quando ela crescesse pudesse derrotá-lo. O tempo dela se render, foi o tempo de Ninjato chegar, era um baixinho com duas espadas ninja nas costas e cara de poucos amigos.
-Florete, acabe logo com isso. – Katana mandou.
-Acabar...? – Valete repetiu em pergunta.
-Foi um prazer mileide... – Florete murmurou puxando alguns centimetros a espada e depois... – O que...?
-Por um momento achei que você fosse matar ela, há há há... – Valete comentou, tinha ido parar ao lado de Dama e a ponta da espada cravou em sua mão. – Bobagem a minha, não é?
-Essa luta não é sua, Valete! – Katana gritou.
-Essa luta já acabou. – Valete falou sorrindo. – Não faz sentido continuar depois que o resultado já está determinado...
-Você é bem rápido... – Florete comentou guardando sua arma, sentou do lado de Katana, parecia levemente aliviado, não que fosse realmente matar Dama, ainda sentia aquela sensação estranha lhe percorrendo. Sorrio para a garota que rangia os dentes como um animal acuado.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Boa noite, Mukarashi

Irá me desejar bons sonhos?
Enquanto ainda nos meus braços,
Se desvelcilhar e partir quieto.
Para não me acordar da mentira.

Irá fazer o mesmo que todos?
Aqueles velhos heróis, acabados,
Que quanto mais estão perto,
Mais se afastam, por suas sinas.

Nunca acreditei em destino,
Em finais pré concebidos.
Então não me dê boa noite,
Apenas continue comigo.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Gata de estimação


Ás vezes minha pele treme,
Com aquele som na garganta.
E meu rosto recostado nele,
Sorri enquanto faz manhã.


Roçando meu rosto, carinho,
Entre o colar e a coleira.
Os sorriso pontudo sozinho,
Já me faz por vontade prisioneira.


Só você me faz sorrir assim,
Mordiscando meus lábios.
E assim que mais pro fim,
Os erros serão descontados.


Esse cafuné atrás da orelha,
Essa mão morna que despenteia,
Meu rosto virado pro lado.


Esse seu jeito que hora e meia,
Me chama e prende como teia.
Me deixando ao seu lado.


Obedeço como se espera,
Mesmo quando falando dela
Você não me vê passar,
Entre as suas pernas.


E o espero como quem pudera,
Mesmo depois de tantas eras,
Não querer assim ficar:
Deitada esperando na janela
Meu dono passar.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Boas ações

II
Quem a via no galpão não podia imaginar como eram as manhãs dela, a saia listrada e a camisa social presa com um laço, a mochila num ombro e as meias três quartos. Estudava num colégio só para garotas, morava nos dormitórios e fugia todas as tardes para o Nocaute Deck, às vezes tinha vontade de começar a arrebentar as coisas antes de chegar lá, mas se continha. Dama era a aluna da última fileira, ficava nos fundos da sala esperando o tempo passar sem que ninguém falasse com ela. Geralmente olhando pela janela, ou então abrindo e fechando os punhos debaixo da carteira.
-Delilah! Nós vamos ao cinema, quer vir conosco? – uma garota perguntou sorridente.
-Uma comédia romântica estréia hoje! – a outra completou animada.
-Não. Eu não gosto de filmes. – ela respondeu enquanto guardava suas coisas.
-Mas vai ser divertido...
-Deixa, ela não quer. Tchau, tchau!
-Tchau.
Era verdade que ela não gostava de filmes, mas aquele não era o real motivo, ouvira os professores avisando as alunas para tentarem "inclui-la" assim que mudou para aquele colégio, como se fosse alguém necessitada ou digna de pena. Ouviu todo aquele discurso sobre a morte de seus pais e como era dificil para ela, como se alguém soubesse. Não queria esmolas afetivas de ninguém, estava muito bem como estava, se trocava depressa e então pulava o muro, fugia daquele lugar como diabo foge da cruz. Seus pais não estavam mortos de verdades, só era mais fácil falar isso do que tentar explicar.
-Mamãe...?
-Não, é a vovó, Delilah. A mamãe não vai voltar e o papai também não.
-Por que?
-Você tem que ser forte de agora em diante, está bem? Seja uma boa menina e seja forte.
-Vovó...
Ainda lembrava do pedido de sua avó, mais uma ordem do que uma sugestão, fora o último dia tranquilo de sua vida, dali em diante se tornara dormente. Não podia chorar ou sentir dor, afinal a mandaram ser forte. Lera em algum lugar que a força vem de alguém para proteger, ela não tinha ninguém para proteger, mas também não podia ser fraca, se prendia naquele dilema racional ao mesmo tempo que esmurrava garrafas. Não queria ter quem proteger, se alguém precisava de proteção era porque era fraco e ela não queria ficar perto de pessoas fracas, não queria ficar perto de pessoas que se machucam.
-Me passa logo sua carteira almofadinha! – um muleque falou chutando outro encima da máquina que vendia refrigerantes.
-O que foi, vai chorar com a mamãe? – outro perguntou.
-Por favor, eu não gosto de brigas...
Era muita covardia cercar alguém daquele jeito, ainda mais um garoto que mal enxergava visto o tamanho das lentes de seu óculos, ainda mais um garoto que parecia ter saído de alguma sátira nerd. Era ritual seu comprar um refrigerante ali e ir até o galpão bebendo, eles estavam no caminho, mas não gostava de se intrometer nos problemas dos outros. Ficou parada olhando por debaixo da aba do boné enquanto o que pedira a carteira dava mais um chute. Por que as pessoas não resolviam os próprios problemas?
-Arg!
-Hey, tem um xereta! – um dos garotos falou apontando para ela, parecia não ter visto que era uma garota, era mesmo dificil com o boné e aquelas roupas largas – O que você quer, cara?
-Um refrigerante. – respondeu encolhendo os ombros.
-Me ajuda! – o garoto de óculos pediu estendendo a mão, mas um dos covardes pisou nela.
-Não adianta pedir ajuda pra outro fracote, otário!
-Fracote...? – o problema se tornou dela imediatamente.
Ela não era do tipo que deixava uma provocação passar, por mais que não se interessate por oponentes covardes e débeis como aqueles, não podia deixar uma ofensa tão pessoal passar. Não levou muito tempo para conseguir seu refrigerante, apenas o tempo de dois chutes nas costelas e alguns socos no rosto, ignorou completamente o garoto de óculos horrorizado encolhido no chão. Não podia se dar ao luxo de ser fraca, nem mesmo nas ilusões de um covarde, isso ela não admitia.
-Vo-vo-você...
-De nada. – ela falou revirando os bolsos, faltava um real para o refrigerante. – Tem um real?
-Ah...um... – ele estendeu a nota tremendo.
-Obrigada, depois eu te devolvo. – ela falou colocando na abertura para notas.
-Não! Não precisa! Muito obrigado...
-Pelo que?
-Me ajudar...
-Eu não te ajudei, eu só odeio que me chamem de fraca. – ela falou pegando a latinha e dando as costas para o garoto, tomava em goles largos, ela não tinha intenção nenhuma de ajudar ele.
A chegada no galpão foi a mesma de sempre, mas o cenário estava diferente, todos sentados em caixotes ou no chão, apoiados na parede num quase circulo torto com Ás que geralmente ficava isolado num canto por perto. Ela parecia a última a chegar e não sabia o motivo da pequena reunião, jogou a lata no lixo e se aproximou de todos, ficando entre Rei e Valete como de costume nessas horas. Sentia a tensão no ar e imaginou que o dia se tornaria ruim muito rápido.
-Eu soube que você fez uma boa ação hoje, Dama. – Ás comentou, era um homem de barba mal feita que já mostrava os primeiros fios de cabelo branco, precoces, mas ainda assim brancos.
-Boa ação? – ela lembrou do garoto surrado, mas ficou quieta.
-Os ladrõezinhos que você espancou há menos de meia hora atrás já foram reclamar com os respectivos superiores. Você sabe quem são?
-Idiotas menos fracos? – ela perguntou ajeitando o boné, deixando transparecer os olhos.
-Não, o Clube de Espadas. – Ás falou de maneira séria – Quer me contar sua versão?
-Eles estavam no caminho da máquina de refrigerante espancando algum inapto físico, eu estava esperando eles acabarem até um me chamar de fraca, depois disso não preciso dizer o que aconteceu, não é? – um murmurio de concordância percorreu o círculo, conheciam bem a Dama do baralho.
-Que coisa, já fazia quase uma semana que nós não tinhamos que brigar com uma gangue de delinquentes... – Dez comentou, fez um risco em seu calendório no bloco de anotações que sempre carregava.
-Nós podiamos resolver isso diplomáticamente, não podiamos? – Valete sugeriu.
-Tudo isso por causa de um refrigerante...? – Nove não entendia, estava chocado.
-Se quiser, chefe... – Dama murmurou e apontou para si mesma – Eu vou até lá resolver, vocês não têm nada a ver com isso.
-Você é uma de nós, Dama. A responsabilidade é de todos, tenho certeza que a Katana também pensa assim...
-Então o que vamos fazer? – Rei perguntou.
-Eu vou com as cartas reais até lá, os outros fiquem em grupos até amanhã. – Ás falou colocando a jaqueta e rangendo os dentes. – E Dama...
-O que?
-Da próxima ache outra máquina de refrigerante...
-Tá.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Temporada de Caça

Aguçou os meus sentidos,
Ainda sinto seu perfume
Impregnado na minha roupa.
Acenda mais um e fume.

Quebrou meus óculos,
Já posso enxergar no escuro,
Cada curva e cada detalhe.
Posso a ver pulando o muro.

Cortou minha lingua,
Pois tentei saborear demais.
O gosto doce a amargo,
Que só sua pele trás.

Me escondi sob as cobertas,
Tentando fugir do som,
Que perfura meus timpanos.
Nem tudo a mais é bom...

Posso até sentir a fumaça,
Que você sopra na minha pele.
Posso sentir o próprio ar,
Que acaricia e me repele.

Aguçou os meus sentidos,
Agora depois de derrotada.
Estrou pronta pra te caçar.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Fada madrinha


Não é fácil realizar desejos,
Muito menos advinhar pedidos.
Fada madrinha, anjo da guarda.
Quando seremos ouvidos?

Já que não há nenhuma magia,
Nem ciência para sensações.
Na tentativa e erro me guia,
Para consolar suas emoções.

Não é fácil realizar desejos,
Mesmo aqueles que eu queria.
Não é fácil advinhar pedidos,
Mesmo os que eu já sabia.

E se não posso ser sua fada,
Fada madrinha.
Nem anjo da guarda.

Me deixa pelo menos,
Tentar cambalear contigo,
nessa velha estrada.

O mesmo era uma vez e final feliz


Quisera eu não me importar,
Com cada palavra perdida,
Cada toque esquecido
Por entre páginas seguidas.


Todas histórias já contadas,
Se repetindo nas que virão.
Todos personagens, sempre,
Iguais aos da primeira mão.


Todos meus heróis,
Têm suas virtudes.
Sentimentos e palavras,
Detalhes simples amiúde.


Todos meus vilões,
Têm os seus defeitos.
Encarando de longe, me
fazem acuada e sem jeito.


Quem vai dar o final feliz?
Já não fazem mais príncipes,
Nem cavaleiros armados.
Feliz e tolo é quem me diz.


Quem vai dominar o mundo?
Já não fazem mais monstros,
Nem feiticeiros amaldiçoados.
Feliz e tolo é quem me diz.


Me diz que era uma vez,
Nas páginas viradas.
Numa das curvas dessa estrada.


Me diz que era uma vez,
Nas páginas viradas.
Num dos desvios dessa estrada.


Era uma vez o meu herói,
Era uma vez o meu vilão.
Era uma vez o mesmo de sempre,
Vindo destronar a solidão.


E com as mesmas virtudes,
E os mesmos defeitos.
Entortando os finais,
Endireitando os começos.


Você feliz e tolo me diz,
Era uma vez e final feliz.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Nocaute Deck

I
A tensão na corda era óbvia quando ele era jogado nela, depois ricocheteava de volta para o centro levando outro chute ou soco, os musculos se comprimiam tentando diminuir o impacto dos golpes, mas era dificil se concentrar na defesa ao mesmo tempo que queria tomar cuidado para não machucá-la. Olhos negros e cabelos da mesma cor bagunçados, curtos como os de um garoto qualquer ali, estava brava com ele? Não, aquilo nos olhos dela era desapontamento.
-QUE DROGA, NOVE! – ela berrou colocando os punhos enfaixados na cintura.
-Dama.... – ele começou a murmurar, mas ela o socou no estomago. – Urg!
-Eu já te falei mil vezes, o problema não é você bater numa garota! É bater em que é fraco ou não pode se defender! PARA DE SE SEGURAR!
-Mas...
-Idiota! – ela chutou a canela dele.
-Já chega, Dama, ele é só um número você vai acabar quebrando ele inteiro.
Ela virou a cara irritada, odiava quando o Valete vinha daquele jeito tentando trazer paz ao mundo, pulou as cordas que delimitavam a arena e foi batendo o pé até os chuveiros. Ele odiava deixá-la brava, mas como um número mesmo que não se segurasse não ia conseguir sequer acertar ela! Estava ali há poucas semanas, além dela só havia uma outra garota, a Quatro. A policia os considerava uma gangue, mas eram só um grupo de pessoas que gostavam de brigar e lutar, Nocaute Deck. Ao membros iam do Dois ao Dez, depois vinham as cartas reais: Valete, Dama e Rei. E acima de todos alguém que sequer lutava, mas que era o fundador do grupo: Ás.
-Lutando com o Nove de novo? – Quatro perguntou, era uma loira de rabo de cavalo que sempre estava sorrindo, mesmo quando estava apanhando, completa masoquista.
-É tão óbvio assim? – Dama perguntou abrindo a torneira, dava pra ver fumaça saindo dela de tão irritada. Odiava quando a tratavam como frágil.
-Eu nem sei porque ele se preocupa tanto, só sem roupas que você lembra uma mulher. Fora isso eu sempre achei que você fosse um dos garotos...
-Já está indo pra casa? – ela não se incomodava com aquelas comparações.
-Já, eu tenho um encontro na Zona de Tiro! – Quatro fez o sinal de uma arma com as mãos.
Ninguém sabia o nome de ninguém, na verdade não importava o nome deles. Tinham seu ranking e, às vezes, ganhavam algum apelido, mas os nomes eles deixavam em casa, na escola ou no trabalho. Dama, era Dama, não precisava ser mais ninguém naquele grupo limitado, não podiam haver mais pessoas que cartas num naipe do baralho. Só estava meio vestida quando Valete entrou para se trocar, depois vieram os outros, mas passavam como fantasmas. Não era só a Quatro, ela dentro do grupo sempre foi um dos garotos.
-Dama, me desculpe. – era nove parado do lado dela, de cabeça baixa, a pele morena e os cabelos castanhos quase inexistentes de tão curtos, tinha olhos castanhos timidos e preocupados. – Dá próxima eu...
-Esquece... – ela falou colocando um blusão largo por cima da camisa, pegou seu boné e foi andando até a saída. – Cansei de fracotes que nem você.
-Cara, acho que você levou um fora! – Valete falou o puxando pelo pescoço. – Não fique assim, eu tenho quase certeza que não é pessoal!
-Alias, nós temos uma aposta no grupo... – Dez falou puxando uma caderneta.
-Aposta? – Nove perguntou estranhando.
-É, a maioria acha que ela é lésbica. Só o Rei apostou contra, quer entrar?
-Não!
Todos eles eram insignificantes, cartas menores. Fora a Dama que ocasionalmente lutava com todos, apenas o Valete se envolvia com eles, o Rei parecia ter um mundo próprio não conseguia imaginá-lo numa aposta daquela. Valete era um loiro de cabelos curtos e franja comprida, tinha uma tatuagem de espadas num pulso e a de copas no outro, era um dos membros mais antigos do Nocaute Deck. Os números menores não entendiam como ele se tornara uma carta real, sempre o viam se excercitando, mas nunca lutando, apenas fazia piada de que era tímido, ou então um amante e não um lutador.
-Nove... Aonde você está indo? – Valete perguntou vendo o outro fazer uma curva para o lado errado.
-Eu ouvi um barulho atrás do galpão. – Nove falou saindo correndo.
-Ei, garoto!
O garoto finalmente entendeu porque tantas vezes Dama aparecia com faixas nos braços e pernas, atrás do galpão havia uma enorme prateleira na parede, que ela enchia de garrafas de vidro e as quebrava com murros e chutes, o blusão jogado de lado e a cabeça baixa para o boné proteger os olhos, era um ritual diário depois que a tarde chegava, não queria ir para casa tão cedo. Valete o puxou pelo ombro e mandou fazer silêncio, o loiro lembrava uma vez que alguém gritou e no susto ela chutou uma garrafa na cabeça do cara.
-Você podia trabalhar numa recicladora no lugar daquelas máquinas de moer vidro, Dama.
-Rei... – ela murmurou virando para olhá-lo, levantou o boné e esfregou o suor da testa com o pulso já que as mãos estavam cortadas aqui e ali. Já não se incomodava com pequenos cortes.
-Você devia ir pra casa, é noite de semana você tem aula amanha. – ele falou jogando um rolo de ataduras pra ela. – Suas professoras nunca perguntam como você se machuca?
-Desde quando alguém se importa? – ela perguntou dando as costas pra ele, mas começando a enfaixar as mãos.
-Boa noite, Dama! – o Valete falou acenando enquanto ela passava.
-Vá pra casa também, Valete. – Rei falou o encarando. – Que eu saiba você está reprovando em todas as matérias, exceto número de advertências por dormir na aula.
-Você parece mais velho que o Ás falando assim, Rei! – Valete deu risada arrastando o Nove dali. – Vem, garoto... Antes que sobre pra você também...
-Desde quando ela...?
-Sempre. – Valete respondeu com um sorriso.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Canção de ninar



Venha se lembrar,
Dos pesadelos de criança.


Venha me acompanhar,
Por uma melodia sem dança.


Eu ainda tenho medo,
Da noite e do escuro.
Tenho medo da cama vazia,
Por isso eu o procuro.


Acompanhar passos que
Desconheço eu tento muito.
Mas sigo descalço e
Quando a noite gira fico mudo.


Falando comigo mesma,
Com as paredes se preciso.
Só pra escapar do medo,
Na escuridão sem paraíso.


Tocando algumas notas,
Mais amigas que rodopios.
Mas sem cantar, não o sei.
Como metal arranhando, arrepios...


Será que você pode entender?
O medo que eu tenho quando só.


Será que você pode entender?
O que busco quando estou só.


Se vier me fazer companhia,
Quando a noite cair eu canto.


Se me emprestar sua voz,
Empresto qualquer acalanto.


Canções, para ninar a mim mesma.


Medos, para tocar nossa tristeza.

Cruzadas

Estranhamente parelhas,
seguem-se vidas na terra.
Que ora e outra se cruzam,
com outras vidas paralelas.

E assim se fazem estradas,
e se fazem futuros. Linhas.
Que correndo ritmadas,
se trombam. Nós em linhas.

Quem há de desatar,
a enroscada das trajetórias?
De vidas parelhas, cruzando
outras vidas e suas histórias.

Não é de estranhar que
me conheça tão bem, e
além disso conheça quem,
um dia também me quis bem.

Não é de estranhar que eu
cá em meu canto encontre,
quem de teu canto foge.
E assim as vidas montem,
suas cruzadas.

sábado, 31 de janeiro de 2009

Casa e Familia (Final)

12
Já passava da meia noite, ela sabia por causa da posição da lua no céu quando Aku partira, não se virou, ficou ali parada como se esperasse algo acontecer para saber se tinha vontade de fazer uma coisa ou outra. Ele a convencera a tentar algo diferente, argumento que eles humanos eram tão idiotas, não era preciso sair por aí matando, era só engolir o mal de dentro deles. Foi assim que Louhi soube que podia ajudar Tapio, foi assim que soube que Aku podia ajudá-la. Nunca seria humana, mas estaria bem menos longe disso. Aku por algum motivo, não parecia bom nem mau, apenas... Aku.
-Não é a primeira vez que você me faz sentir um inútil... – Tapio murmurou paralisado, não sabia se estava feliz ou simplesmente deprimido em visão de sua inaptidão. – Mas você e Aku foram dois golpes seguidos.
-Eu já falei Tapio, você não é fraco... – ela não se virou para ele.
-Só não sou um monstro. – ele riu de si mesmo – Por que você nunca me contou?
-Eu contei, você só não entendeu. – uma brisa suave batia pela floresta, aparentemente ninguém lembrava de Ukko, não fazia sentido, não podiam fazer mais nada pelo velho mestre. – Seu trabalho é me matar. Lembra?
-Não vai acontecer. – ele falou colocando as mãos no bolso. – Estava pensando em me aposentar...
-Tão cedo? O que vai fazer...? – ele queria que ela virasse, mas ela continuava olhando para onde Aku tinha partido.
-Me redimir... – ele falou sorrindo dando um passo a frente. – Se eu conseguir... Louhi...
-Se redimir do que?
-Olhe pra mim...
-Eu não quero.
-Por favor...
-Não...
Ele preferia que ela virasse, mas o como não importava desde que pudesse olhar para ela, a girou pelos ombros a fazendo ficar de frente para ele. Era a primeira vez que via o rosto dela tão triste, os olhos cinzas como pedras frias e os lábios semi abertos numa respiração fraca, ainda vermelhos de sangue. Ela olhou para o chão, não podia mover os olhos dela como fizera com o corpo, mas tinha que fazê-la olhar em seus olhos. Puxou-a um pouco mais perto, sentindo a pele dela fria sob suas mãos.
-Eu queria tentar me redimir... Eu queria olhar pra você do mesmo jeito que olhei pela primeira vez que te vi...
-A primeira vez que você me viu você virou o rosto e continuou seguindo a Lahja.
-Não. Aquela foi a segunda. – Tapio admitiu sorrindo. – Louhi, eu quero que você olhe nos meus olhos e veja o que eu vi daquela vez...
-Uma coisa?
-Não.
-Animal?
-Não! Louhi...- ela a chacoalhou de leve. – Eu...
-Eu não sou o que você achava que eu era, Tapio. Não importa o que você viu da primeira vez...
-Importa o que eu vejo agora... – ele falou a puxando e a abraçando – Louhi... Você...
-Não sou humana, eu sei que eu pareço agora... Mas não sou. – ela o empurrou. – Não se iluda...
-Eu não estou me iludindo. – ele falou a segurando antes que saísse andando sozinha pela milésima vez. – Eu sei que você não é humana... E eu sei que por anos tudo que eu pude pensar era que devia matar todo demônios que existisse... Mas eu não sou o garotinho que você viu pela primeira vez também, Louhi.
-Me solta...
-Eu não vou deixar você ir se esconder de novo... Cada ano, você mudava, mas eu também... Aquela raposa em Sirpa, Emma e o mordomo dela... Você. Não importa o que vocês são eu não os mataria. – Tapio engoliu em seco – Confia em mim.
-Não nos mataria porque você não ia conseguir, fracote... – ela deu risada, ele sentiu como se o peso de toda floresta tivesse sumido. – Por que você não desiste de mim?
-Eu sou seu guardião. E é isso que eu sempre vou ser, Louhi. – ele falou sorrindo.
-Claro...
Ambos saíram andando, como sempre andavam, um alguns passos de distância do outro, mas por algum motivo pareciam mais próximos. Os passos combinavam e olhavam na mesma direção enquanto caminhavam, na direção do que por muito tempo foi a casa deles. Um lugar pequeno no meio do nada, para evitar perguntas e curiosos, pequeno o bastante para não se afastarem um do outro. Controle, tudo que Ukko ensinou para ela, a entrega de Aku, tudo fora pensando naquele dia. Controlar a si mesma e não deixar nada a controlar.
-Louhi, Aku....
-É um vampiro. – ela respondeu antes de vir a pergunta – Ukko o prendeu quando era jovem e o usou de arma desde então...
-Eu notei, mas...
-O que?
-Qual exatamente é a ligação entre vocês?
-O que?! – ela deu risada.
-Eu ouvi vocês... Você não está apaixonada por ele, está?
-Não. – ela respondeu simplesmente encolhendo os ombros.
-Você respondeu muito rápido...
-Qual o problema?
-Eu tenho que cuidar de você! Um vampiro não é uma companhia saudável! – e realmente, não era.
-Você se preocupa demais...
-Não, você que se preocupa de menos.
-Tapio. – Louhi chamou parando de andar. – Não se preocupe, eu não tenho nenhum interesse em vampiros.
-Está bem...
-Eles são muito gelados. – Louhi falou continuando a andar – Talvez um lobisomen ou algo assim.
-O que?! Você está brincando né? – Tapio saiu correndo atrás dela que começou a gargalhar – Isso não tem graça, Louhi...
-Você não devia parar de se preocupar com essas coisas e me ajudar a achar o que sobrou do mestre, Ukko? Se é que sobrou alguma coisa... – ela comentou olhando para os lados.
-Louhi...
-O que?
-Não é nada, vamos pra casa. – ele falou sorrindo.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Liberdade

11
-Louhi!
O grito de Tapio nem foi ouvido enquanto ele vinha sangue jorrar depois do último esforço de Esteri. O gelo começou a se partir e desmoronar, ele sentiu que tudo que ele conhecia caía junto, como um castelo de cartas diante do sopro da respiração de quem assiste. Por que os olhos dela estavam tão distantes do olhar que ele conhecia? Assistiu Louhi pairar no céu, com asas que não batiam, flutuando com os olhos brilhantes fixos no gelo e na dama que desmoronava junto com ele, era como assistir sua própria humanidade desmoronar. Quando seus pés tocaram a pilha de escombros congelados, ela já não sentia frio.
-Me deixa ver seu ferimento... – Tapio pediu se aproximando mas foi parado pela ponta afiada da asa dela que parou em seu pescoço.
-Não precisa. – quando a asas de metal se moveu ele viu que o ferimento já estava fechado.
-Você está bem? – Tapio perguntou deixando as mãos caírem ao lado do corpo, estava perdido e não sabia o que fazer.
-Que tipo de pergunta é essa, Guardião? – a voz de Eemeli sôou atrás deles, Louhi nem se moveu. – Esteri... Fique em paz, minha menina. E quanto a você Tapio, que tal fazer seu trabalho?
-Mestre Ukko...
-Morto. – Louhi e Eemeli falaram ao mesmo tempo.
Tapio sentiu um desconforto crescente dentro de si, Ukko que matara centenas de demônios, Ukko que mesmo tão velho ainda era mais forte que vários juntos, tinha sido morto. Eemeli tinha trapos e espinhos de sombras do lugar de braços, suas mãos era um espetáculo grotesco e crescente que se alastrava como câncer ao seu redor. Sentia naúseas, o único ferimento no antigo mestre era um hematoma leve em sua face esquerda, Tapio estava acostumado a ver monstros e estar cercados por eles, mas naquele instante entre Louhi e Eemeli, foi a primeira vez que ele teve medo.
-Então, Tapio, você vai matar Louhi ou não?
-Por que eu faria isso? – Tapio perguntou erguendo os punhos.
-Está mais do que claro que ela já não têm nada de humano, se é que um dia teve. É trabalho do Guardião, matá-la... Faça seu trabalho. – Eemeli sugeriu sorrindo. – Não concorda, Louhi?
-Claro... – ela murmurou virando apenas o rosto, deu um sorriso pontiagudo – Assim que eu matar você...
-Louhi...
-Como pretende fazer isso, gata de rua? – ele perguntou dando um passo à frente.
-Ainda não decidi.
-CHEGA! – Tapio gritou criando uma jaula ao redor de Eemeli – Parem de me ignorar e brincar comigo!
-Talvez se você não fosse tão fraco, Guardião. – Eemeli falou atravessando a jaula como um fantasma. – Saía do caminho.
Um tapa, um único tapa foi suficiente para Tapio receber cortes por todo corpo e cair metros mais tarde, só preservava uma parte de sua consciência quando tocou o chão, sentindo a dor se alastrar. O que quer que fosse que estava no braço de Eemeli agora estava nele também, teve que selar a si próprio, mas por mais que a marca luminosa tivesse se tornado parte do seu corpo, ainda doía. Lembrou do primeiro selo de Louhi, o troll, mesmo depois de selado ela se debatia e socava as coisas, como se tivesse algo errado. Imaginava que devia ser daquele jeito, doloroso.
-Eu nunca entendi como o maior assasino de demônios de todos os tempos a deixou sob suas asas. O que Ukko viu em você? – Eemeli perguntou analisando as marcas no corpo de Louhi, suas asas de metal, a manopla a correntada ao seu braço. – Vejo que ele deu Aku à você...
-Controle... – Louhi falou sorrindo olhando para o chão.
-O que?
-Ukko disse que era a única coisa que eu tinha que aprender. – ela falou erguendo o rosto, os dentes pontiagudos à mostra. – Aparentemente sou melhor nisso que você.
-Do que está falando?
-Em breve... – a voz dela parecia a de Aku – Você vai perceber em breve, mestre.
Não que a troca de socos e saltos para desviar de chutes não fosse interessante, mas parecia mais um cumprimento banal até que finalmente Eemeli lançou suas sombras e espinhos para espremer Louhi. Não era o primeiro a tentar prendê-la e matá-la, mas não seria o último. Não foi dificil sentir no meio das sombras e espinhos presos a sua pele a rasgando junto com sua roupa, as correntes tilintando enquanto deslizavam. A mínima presença de Aku a fazia arrepiar, podia sentir qualquer coisa vinda dele mesmo de longe, ficou parada, assistindo Eemeli a cobrir de sombras e espinhos.
-Só isso? – Eemeli perguntou – O velho Ukko deu mais trabalho...
-A julgar pelos seus movimentos, já deve ter chego ao pescoço... – ela murmurou enquanto olhava o céu entre as árvores.
-O que?
-Você está morto mesmo, mestre, só não sabe ainda. – ela falou muito tranquilamente, parecia didática. – Por isso eu sou melhor que você, até Ensio era... Mesmo depois que o selo se partiu ele conservou o corpo e uma parte das faculdades mentais.
-Acha que eu perdi minha mente? – Eemeli perguntou dando risada. – Muito engraçado.
-Ainda não... Mas seus braços, pernas e torso já foram devorados. Não vai demorar pra essa coisa subir pra sua cabeça. – ela afirmou séria – E então você, não vai mais existir.
-Eu vou mudar, só isso... – ele afirmou, ouviu o tilintar e acabou levando um susto, notou que a corrente havia se enroscado em seu braço. – Aku?
-Se fosse realmente você teria sentindo a corrente se enroscando... – Louhi comentou o vendo preso como ela dos pés até o pescoço. – Aku é bem gelado...
-Isso não vai me machucar. Você por outro lado... – ele comentou sorrindo.
-É, essa coisa dói... Espinhos e sombras, parece uma erva daninha dos infernos. Mestre, por que você não ajudou Esteri? – Louhi perguntou o encarando.
-Você me viu?
-Antes dela morrer, antes de me golpear, eu vi você entre as árvores atrás dela. Por que não a ajudou? – Louhi perguntou novamente.
-Ela fez a parte dela...
-Obrigada mestre. – aquilo era um sorriso?
-Você enlouqueceu? – Eemeli perguntou vendo o rosto dela se contorcer, em breve poderia parti-la em mil pedaços, ela não ia aguentar muito mais.
-Muito obrigada. Eu precisava saber que era mais humana que alguém... – Louhi murmurou.
-Agora? – Aku perguntou.
-Tudo que resta de você é a cabeça, mestre. O resto é só sombras e capim... – Louhi afirmou com um brilho estranho nos olhos. – Agora, nem isso...
As correntes se estreitaram puxando Eemeli para perto, assim que ele se aproximou as asas que Louhi se fecharam cortando o pescoço dele, a cabeça rolou por algum tempo, o corpo apenas se dissolveu, deixando a mostra uma Louhi cheia de cortes profundos e vestindo trapos. Aku se encolheu de volta para o braço de sua mestra, na forma de uma pistola. O braço doía, mas conseguiu mirar um último tiro para estourar a cabeça de Eemeli antes que ela voltasse a vida de algum jeito, sentiu os dedos finos e gélidos em seu rosto.
-Você devia tê-lo matado logo, mestra...
-Não.
-Não?
-Se ele não me machucasse, o Tapio não ia conseguir... – ela tossiu sangue.
-Não me diga que está pensando em deixar ele a matar?
-Não se preocupe, eu não vou levar você pro inferno comigo. – Louhi falou se levantando com dificuldade.
-Estou certo disso. – Aku murmurou, será que estava sorrindo? – Mas ainda assim a prefiro viva...
-Eu não sou seu tipo lembra? Você gosta de humanas seu parasita... – Louhi fez uma careta ao sentir a corrente se enroscar em seu braço e apertá-lo – Para com isso.
-É tão repulsiva assim a idéia de não ser humana? – Aku perguntou, ela podia vê-lo na sua frente, a empurrando contra uma árvore, os olhos vermelhos a encarando. – Você despreza sua espécie tanto assim?
-Por que você se importa? Eventualmente vai achar outra pessoa pra sugar...
-Vou... É verdade. – ele falou ajeitando os cabelos dela atrás da orelha, seus olhos deslizaram pelas pontas das asas dela, seus dedos correram por seu braço até chegar na marca da cintura. – Mas até lá, você é minha mestra...
-Um bom mascote... – ela murmurou fechando os olhos.
-Exato... Abra a boca. – ele mandou.
Ela sabia o que era pelo cheiro, mas se recusou a confirmar com os olhos o que escorria por seus lábios, sentiu o corpo leve deslizando até o chão. Podia sentir Aku a envolvendo, correntes enroscadas juntando os rasgos de suas roupas, a saia estava quase inteira, apenas um corte na coxa direita que era até útil. Quando abriu os olhos de novo tudo que podia enxergar era Tapio encolhido no chão com um selo no peito, via marcas de cortes horizontais atravessando o corpo dele. Ficou observando o jovem respirar com dificuldade por algum tempo, lembrava do garoto sorridente que sempre tentanva se aproximar.
-Não se preocupe, a dor vai passar... – ela falou sorrindo enquanto se aproximava agachada.
-Louhi... – ele parecia não enxegar direito, apertava os olhos.
-Não é trabalho de um sacerdote engolir um demônio. – aquele não era o rosto de Louhi, nem suas mãos, nem sua voz, não era nada do que ele lembrava de toda sua vida. Eemeli estava certo, já não havia nenhum traço de humanidade nela.
-Não...
-Último... – ela prometeu baixando o rosto até a altura do selo.
Tapio sentiu os lábios dela como água fria, ou então metal contra sua pele, então sentiu algo o envolver e empurrar. Sabia o que ela estava fazendo, mas não conseguia sequer mover-se para longe dela, o selo aos poucos se apagou de seu peito, não sabia como, mas foi o que aconteceu, finalmente ela se levantou e ele sabia que aquela coisa estava dentro dela agora, em algum lugar daquele corpo que um dia fora de Louhi e agora era daquela criatura, estava o que corrompeu mestre Eemeli. Ergueu a mão na direção dela como quem tenciona criar um selo.
-Não... – ela murmurou com um sorriso.
-Mas...
-Seu trabalho não é me ajudar, Guardião. – ela sorriu, ele sabia que aquilo era um sorriso, mesmo quando as correntes se alastraram por todo corpo dela, ele sabia que ela estava sorrindo, as correntes brilhavam com todos os selos que ele conhecia, outros que nunca vira.
-Aku?
-Eu falei que ela não precisava de você... – a voz saía da corrente.
As asas de metal ficaram negras, sombras se espalhavam e começavam a dissolvê-las a fazendo cair aos pedaços, pedaços que se dissolviam na luz dos selos. Depois caminharam pelas costas, engolindo as marcas da cintura, escorrendo pelas pernas, subindo pelos braços até envolver o pescoço. Sombras engoliam e depois era engolida pela luz, assistiu-a chegar ao pescoço, os olhos brilharam cinzas, um sorriso afiado que ele conhecia bem. Sua voz quase não saiu a tempo daqueles olhos o reconhecerem.
-Louhi, não... – as sombras envolveram todo rosto dela, depois se iluminaram, as correntes caíram com um barulho que um condenado devia fazer ao morrer, os olhos dela se fecharam. – Não! Louhi...
Mas ela não respondeu, nem quando ele aparou sua queda para o chão. Apesar de não haver mais nenhum ferimento, nenhuma marca, nenhuma corrente apertando seu corpo, ela estava fria e pálida, imóvel. Era o mesmo rosto exausto de quando terminava um trabalho e se jogava na cama, como se não houvesse mais nada pra fazer. Ele não podia sentir seu coração batendo, nem a respiração parecia sair de seus lábios semi abertos. Ele realmente não podia matar ela, mas aparentemente ele dera o modo perfeito dela mesma se matar. Odiou a si mesmo, então odiou Aku.
-Você devia cuidar dela... Não era pra isso acontecer... Mesmo que...
-Mesmo que ela fosse um monstro? Tocante. – ele levantou o rosto a tempo de ver Aku, ainda tinha as correntes, mas nunca pareceu tão livre. – Era só uma questão de tempo até eu quebrar o selo...
-Então é isso? Você só protege ela até estar livre seu...
-Não diga mais nada. – Aku falou se aproximando. – Você é que a enxergou como um monstro, sequer a reconheceu como a garota que você tanto adorava quando ela chegou. Sabe qual foi a última coisa que ela viu nos seus olhos? Eu posso mostrar se quiser... Foi isso... – Aku ergueu um pequeno espelho.
-É minha culpa... – Tapio admitiu, olhando no espelho notou a expressão que tinha quando olhava para Aku, olhos frios e odiosos num rosto que sempre fora gentil. – O que aconteceu?
-Oito demônios, uma refeição bem balanceada se me perguntar. Não é meu prato favorito, mas era o que eu precisava pra quebrar o selo... – Aku falou fazendo carinho no rosto de Louhi.
-Você a matou pra se soltar...
-Não. – Aku negou.
-Ela tinha sete selos, mais ela são oito... Oito monstros. – Tapio contou.
-É, mas um não estava selado... O que ela arrancou de você... – Aku apontou para onde antes havia um selo em Tapio – Você devia agradecer, ela sabia o quanto você odeia monstros então o impediu de ser um. E ainda por cima fez seu trabalho por você... Acabou com os monstros.
-Menos um... – Tapio falou esmurrando, mas Aku segurou sua mão.
-Você está vendo, mas não está entendendo a situação. Seu mestre não ensinou nada a você, guardião? – Aku perguntou empurrando o braço de Tapio de volta. – Você deve compreender a situação, não simplesmente olhá-la...
Aku puxou Louhi dos braços de Tapio, era como uma boneca de porcelana, parecia tão frágil, apesar de não haver mais dano a se causar. Tapio no começo só sentiu raiva, mas aos poucos notou algo que não notara antes, todos os selos sumiram, se Aku engolira os sete demônios e o que estava em Tapio e fora arrancado, mas não Louhi. Então ela... Viu o movimento leve da respiração, por algum motivo o irritava Aku parecer tão delicado e gentil ao segurá-la, contemplando o rosto pálido.
-Nunca tive uma mestra tão teimosa... – ele falou mordendo a própria boca. – Nunca...
-Não pense nisso. – Tapio mandou se levantando num salto.
-A quer morta de verdade, então? – Aku perguntou de maneira aparentemente enraivecida, ou estaria se divertindo com a situação. – A prefere humana morta, do que viva e... Outra coisa?
-Eu a quero como era e não como você é... – Tapio respondeu.
-Não se preocupe com isso, ela já é um monstro, não pode ser dois ao mesmo tempo...
Mas não era só isso, Tapio sentiu a raiva lhe subir a cabeça quando viu Aku deixar o sangue de seus lábios escorrer para dentro dos dela, aos poucos a cor voltava a sua face, como um passe de mágica. Lentamente ele soltou as pernas dela que agora sustentavam a si mesma, era como assistir uma flor erguer-se para o sol e abrir-se, mas não havia flor nem sol. Apenas Louhi abrindo os olhos cinzas lentamente na escuridão ao mesmo tempo que Aku sorria e lambia os lábios.
-Eu adoro quando você está frágil, quase parece...
-Outra coisa... – Louhi murmurou sentindo Aku lhe dar um beijo rápido no rosto, o frio passou, mas ainda se sentia fora de si.
-Não vá se apaixonar por mim. – Aku falou sorrindo.
-Igualmente. Cala a boca e saí daqui antes que eu mude de idéia sobre te deixar livre.
-Como quiser, mestra. – Aku falou sorrindo se afastando sem deixar de olhá-la sequer um segundo – Obrigado pelo jantar...

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Estrela

10
-Caçadores de demônios... Ukko, você está... – parecia procurar um adjetivo para escorrer por sua lingua como veneno – Velho. E você parece o mesmo menino de sempre, Tapio, correndo atrás de coisas que não existem.
-Eemeli, você está monstruoso. – Ukko murmurou de volta.
-Mestre Eemeli? – Tapio perguntou embasbacado, ele deveria estar morto há anos.
-Infelizmente para vocês a terra ainda não me engoliu. – Eemeli passou a lingua pelos lábios como quem saboreia o gosto das próprias palavras – Sabe, Ukko, sempre pensamos que se perdessemos o controle seriamos apenas mais um demônio. Mas é tão mais que isso...
-Mais um demônio? Não. – Ukko falou dando um passo a frente. – Uma abominação da natureza.
-E isso faz de você o que, velho amigo? Um projeto de abominação?
-Tapio, vá atrás de Louhi. Ela vai precisar de você
-Mestre...
-É melhor ouvir ele, Tapio. Antes que você perca a chance de dizer adeus a pequena Louhi. Como vai aquele animal selvagem, Ukko? Espero que você não tenha esperado demais dela, ela poderia não aguentar.
Tapio saiu correndo no momento em que Eemile virou o rosto para Ukko, mas pegou aquelas palavras no ar, animal selvagem. Como ele fora o único a não perceber que ela não era humana? Louhi devia se sentir só, esmagada entre grupos diferentes, sem fazer parte de nenhum, que imagem ela enxergava toda vez diante do espelho? Será que se via como ele via Eemeli? Um homem de cabelos já brancos, mas cujo rosto permaneceu jovem, marcas negras subindo pelo pescoço, dentes proeminentes, olhos curvos e brilhantes. Sombras se espalhando pelos braços, escapando pela manga comprida do casaco escuro, sombras que tomavam formas que andavam entre trapos e espinhos. Como será que ela achava que ele a via?
-Eemeli. Então você agora é um interventor para o outro time? – Ukko perguntou deixando as marcas de selos em seu corpo aparecerem, marcas que lembravam correntes.
-Não, Ukko. Eu estou formando meu próprio time e desde que nossos antigos alunos concordem eles terão uma longa vida ao meu lado, exceto os sacerdotes... Eles seriam um incômodo. E a pequena Louhi também.
-Você não passa de um erro, agora, Eemeli. Tentar matar Louhi, seria outro...
-Como eu poderia confiar em alguém que não é humana nem monstro?
-Pergunte isso olhando pro espelho, talvez descubra a resposta. – Ukko sugeriu.
-Você sempre foi o grande Ukko, o Exterminador. Eu me reservo o prazer de exterminar você... – Eemeli estendeu a mão, sombras, trapos e espinhos, na escuridão nada parecia com nada. – Pode ser fácil ou díficil.
-Você sempre teve um fraco pelos trabalhos fáceis. Atacando um velho assim...
Tapio não sabia o que estava acontecendo enquanto corria, mas ouviu claramente um grito que só podia ser de Ukko prestes a matar alguma coisa, antes que percebesse estava cercado por criaturas que se escondiam nas sombras, só teve tempo de se jogar no chão. Se aquele tipo de armadilha barata, de seres inferiores fosse o ferir, então era tão bom quanto nada. Batendo as mãos contra o solo fez brilhar um selo e lanças de luz saíram de suas costas como um porco espinho perfurando as sombras que se dissolveram. Não podia perder tempo, tinha que achar Louhi. Quem Eemeli teria enviado para matá-la? A resposta veio como um relâmpago na escuridão, cortando o céu num brilho frio.
-Esteri... – Tapio murmurou tentando conter as batidas exaltadas de seu coração, sentiu um arrepio subir pelos seus braços.
-Tapio... Quanto tempo... – que tipo de voz a luz tinha? Tranquila e morna, esse era o tipo de voz que Esteri tinha, a criança mais meiga e gentil que passou pelos antigos mestres e ainda assim se tornara uma assassina.
-Esteri... o que você...?
-Você não ia entender, Tapio. – ela falou escondendo as mãos atrás das costas enquanto olhava para o lado, o rosto corado. Cabelos negros cacheados num rosto arredondado como se fosse uma criança ainda. – Você não sabe como é sentir um demônio dentro de você... Também está procurando a Louhi? Podemos procurar juntos...
-O que vocês querem? Me diga Esteri. – ele pediu entristecido.
-Liberdade. – ela falou sorrindo – Humanos vivem suas vidas, demônios vivem as suas vidas... Nós não deviamos ficar nos jogando no meio tentando resolver os problemas dos outros.
-Aonde está sua irmã, Esteri?
-Heli morreu... – Esteri falou deixando escapar uma lágrima, sua irmã era sua guardiã, sempre estavam juntas. – Num dos trabalhos... Então o mestre Eemeli me consolou, eu nunca imaginei que ele ainda estivesse vivo.
-O que vocês vão fazer, Esteri?
-Me desculpe, Tapio. Mas para sermos livres, primeiro eu preciso acabar com todos os caçadores de demônios... Você e todos os outros sacerdotes têm que morrer. – ela começou a chorar. – Me desculpe mesmo...
-Se está tão triste não devia fazer isso. – ele murmurou erguendo as mãos com as contas.
-Não devia, mas eu quero... Eu quero outra vida...
-Matar parece um péssimo jeito de conseguir isso.
Tapio não teve muito tempo pra admirar o que acontecera com Esteri, estava ocupado conjurando uma barreira ao redor de si quando as lágrimas da garota congelaram, assim como seus braços de onde brotaram lâminas de gelo, mesmo atrás de sua barreira podia sentir o frio apesar das lâminas não o terem machucado. O triângulo de luz iluminava a imagem congelada e cheia de espinhos de Esteri, um único selo em forma de flor marcado em sua testa. Ao olhar para o chão notou o gelo se espalhando a partir dos pés dela, caminhando na sua direção, envolvendo a floresta num abraço mórbido.
-Não adianta, Tapio. Eu sinto muito, mas sua barreira não vai funcionar... – Esteri afirmou com uma expressão chorosa.
-Eu não quero brigar com você, Esteri.
-Eu também não queria brigar com você, Tapio... Eu vou te congelar vivo, porque não quero destroçar você... Você foi sempre muito gentil comigo... – ela sorriu tristemente, um sorriso debil de um demente seria a descrição exata.
-Eu não posso morrer tão fácil, Esteri. Ainda tenho coisas pra fazer...
-Tapio! – ela gritou quando ele deu um soco na própria barreira, a luz se esmigalhou como cacos de vidro voando na direção dela que se protegeu com mais gelo. – Não me machuque! Eu queria que você não complicasse as coisas!
-Eu vou libertar você, Esteri. E sei que Heli vai recebê-la de braços abertos...
-Você não mata nem insetos, Tapio...
-Louhi... – Esteri e Tapio pareciam surpresos com a voz que chegava de tão perto, ninguém a viu chegar até ali.
-Eu lembro de você, a que cantava com a irmã... – Louhi murmurou levantando a saia para pegar Aku. – Parece que é sério. Eu reparei que tinha alguém tentando matar Ukko e decidi voltar, mas não sabia que eram velhos conhecidos...
-Sinto muito, Louhi, mas...
-Me poupe. – Louhi pediu estapeando o ar. Os olhos de Louhi pareciam enxergar mais do que o rosto gentil e choroso de Esteri – Você veio por mim, não foi? Então para de se distrair com ele...
-Está bem. – Esteri falou abaixando as mãos de gelo afiado. – Monstros primeiro.
-Monstros? Claro... – Louhi baixou o rosto.
-Louhi, não! – Tapio estendeu a mão para ela, mas Aku que tinha se tornado um bastão o empurrou para longe num movimento só. Sentiu o impacto doloroso nas suas costelas ouvindo uma estalar. – Louhi...
-Que horror... – Esteri murmurou levando as mãos ao rosto, seu espanto aumento ainda mais quando Louhi puxou de volta o bastão. – Eu estou... com medo...
Tapio sabia muito bem quais eram os sete selos de Louhi, mas nunca a vira usar todos. Era justificado, o selo na testa de Esteri era o de uma feiticera que vivia nas montanhas de gelo, ele nunca vira um selo tão poderoso, talvez mais que os sete de Louhi juntos. As marcas pelo corpo dela, as asas de metal que saíram bruscamente respingando sangue ao redor e aquele rosto, com olhos prateados que brilhavam e dentes afiados, marcas negras em seu rosto como uma máscara. As marcas eram parte de selo, mas aqueles olhos e os dentes, aqueles eram de Louhi, ele sabia agora. Aquela era Louhi esse tempo todo?
-Que tipo de monstro você é? – Esteri perguntou lançando pedaços de gelo sobre Louhi como uma garota que atira objetos numa barata. Todos bateram contra as asas de metal que se fecharam na frente de seu corpo, uma pequena fresta se abriu permitindo ver o rosto.
-Primeiro Selo. Troll... – Louhi murmurou a resposta.
-Por isso ela é tão forte e dificil de machucar. – Tapio murmurou, daquilo ele sabia.
-Segundo Selo. Lobisomen... – ela continuou indiferente, a corrente de Aku se enroscou em seu braço, formou uma manopla no lugar do bastão.
-Impossivel...
Lobisomens eram uns dos monstros mais rápidos que existiam, dificeis de encontrar por se fazerem de humanos tão bem. A idéia de alguém conseguir capturar um e lacrá-lo tendo apenas o selo de um troll era irreal. Esteri não quis ouvir o resto, cada vez atirando mais gelo em Louhi que nem ao menos se mexia como se tudo aquilo fosse fútil demais para uma reação. Tapio, no entanto, teve que fazer uma barreira para não ser acertado pelos ricochetes, ela continuou falando. Terceiro Selo, sereia, não era mera alteração da sua voz que permitia indução, as unhas ficavam afiadas e fortes como garras, assim como os dentes fortes o bastante para roer ossos de homens.
-Quarto Selo, Espectro. – não sentir dor, não fazer barulho. – Quinto selo, Corvo.
-Essas asas são amaldiçoadas... – Esteri murmurou, corvos eram maus agouros, dificílimos de matar, diziam que suas asas tinham o peso da sentença de um condenado.
-É um bom escudo, pior não fica...
Tapio pensou alto, lembrava de ter sido contra aquilo, mas Louhi insistiu, pois não queria matar o corvo. Um corvo não é como outros demônios, ele não simplesmente fica quieto e responde aos selos como os outros, por isso quando Louhi chegava naquele selo o resultado era machucar a si mesma. Não conseguia calcular a dor daquelas asas saindo das costas dela rasgando a pele, mas também não conseguiu calcular muita coisa. Esteri acabou indo parar no topo de uma coluna de gelo lançando verdadeiras espadas cristalinas, mas Louhi continuava como se nada tivesse acontecido.
-Sexto Selo, Feiticeira. – feiticeiras tem corpos frágeis por natureza, mas a manipulação de energia e matéria que elas fazem as tornam muito perigosas, ao ponto de em alguns casos poderem se regenerar. – Sétimo Selo...
-Jalmari, a pantera... – Esteri murmurou reconhecendo os olhos, eram os mesmos. – Você... é mesmo filha dele...
-E Aku... – Louhi murmurou erguendo a mão direita, a manopla de metal frio. – Agora pare de brincar, Esteri. Ou você não vai ter nenhuma chance.
-Mesmo que não brinque ela não tem chance, mestra... – Aku riu-se.
O sacerdote reconheceu medo genuíno nos olhos de Esteri quando Louhi ergueu a mão, ele lembrava bem do sétimo selo, uma pantera velha, mas que mesmo assim deixou Louhi de cama por uma semana e ele por quase um mês repousando depois de fazer o selo. Ele nunca poderia imaginar que o monstro que agia como um predador sem consciência era pai de Louhi, apesar daquilo explicar como ela caçava tão bem. Mas não era só aquilo, Jalmari podia ser uma lenda entre os monstros, uma lenda velha ainda assim uma lenda, mas Aku era a antiga arma do Exterminador. Logo o medo se encolheu e Esteri sorriu.
-Que alivio! Assim o mestre Eemeli não deve ter problemas. – Esteri comentou sorrindo e levando as mãos ao coração. – Você é mesmo um animal, Louhi... Se não teve piedade nem do próprio pai eu que não terei de você!
-Louhi!
Foi a última coisa que ouviu de Tapio antes de ignorar a presença dele por completo, carregado pela rajada de vento, neve e pedras pesadas de granizo, o metal de suas asas estalava conforme congelava e teve que batê-las com força para soltar o que o gelo juntara. Louhi se movia com a facilidade que outros não tinham, Esteri não era de se mover, ela deixava o gelo e a neve fazerem todo o trabalho e aquilo funcionaria. Mas desde Aku lhe congelar de dentro pra fora, o frio de Esteri parecia irrelevante e dançar entre a neve estava parecendo estranhamento divertido e romântico.
-Mestra, você consegue se ver nessas colunas de gelo? – Aku perguntou enquanto desviavam de estalagmites cristalinas e afiadas.
-Consigo... – Ela falou olhando o próprio reflexo.
-Olhe melhor... – ela sentiu a mão dele a puxando, podia ver nos reflexos do gelo a imagem de Aku a conduzindo a dançar entre o gelo que a atacava. – Já me reconhece?
-Dr...Aku... – ela murmurava enquanto dançava. – Dr... Aku... la...
-E você? Pode se reconhecer? – ele perguntou a encarando, sentia as mãos dele deslizarem pelo seu pescoço. – Um miado, um rugido... Você daria um excelente bichinho de estimação, minha mestra.
-Aku... – ela chamou.
-Eu vou cuidar de você, mestra. Minha mascote... – ele falou sorrindo, podia ver no gelo os olhos vermelhos brilhando – Essa cadela tem que aprender uma lição.
-Tão frio... – Louhi começava a sentir os braços e pernas congelando.
-Eu entendo. Não se preocupe, vou te esquentar... – ele garantiu. – Você não precisa de mais nada, mestra...
A floresta se tornara um jardim congelado de reflexos gélidos, Louhi nem notara que estava com os olhos vazios já há algum tempo, que seu corpo se movia sozinho, que sua vontade era apenas uma chama morna de calor. Toda consciência que tinha estava aprisionada entre blocos de gelo e sopros de neve, já não era humana há tanto tempo, que aquela consciência parecia banal, cada vez mais distante e isolada. Nunca fora humana. Olhos prateados brilhando para o céu noturno, só enxergou de verdade quando estava na mesma coluna de gelo que Esteri, ela estava em seus braços, perfurada nas costas pelas pontas de suas asas, Aku como uma garra cravada nas costelas dela.
-A estrela da manhã, brilha se desmanchando, como cristais de gelo sob o sol. – ela cantarolou baixinho encarando os olhos que escureciam de Esteri, lábios que tremiam tão próximos. – Brilhe mais um pouco, para aquecer o frio, que vem com a manhã. Brilhe para se despedir da escuridão, que desmancha meu eu, me deixe sã. Minha estrela da manhã...
-Estrela da manhã... – Esteri murmurou. – Brilhe se desmanchando... Cristais de gelo...
Louhi chegou a sentir o braço de gelo afiado de Esteri lhe perfurar a barriga, mas não soltou a jovem, esperou que ela finalmente fechasse os olhos para a deixar cair no chão, o gelo se derreteu, escorrendo como o sangue morno. Com a mão direita segurava fechado o ferimento, um frio formigante se alastrando. Nunca fora humana de qualquer jeito, então porque se sentia tão monstruosa naquele momento? Por outro lado Esteri, parecia mergulhada numa paz luminosa.