quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Castigo

5
Tapio estava sentado à sombra de uma árvore, com um sorriso de quem acha graça e olhar atento, mantinha as mãos unidas como em prece, mas se concentrava mais no que ela fazia do que no que estava fazendo. Ukko mesmo não sendo mais oficialmente um professor, não deixara sua posição de mestre e ainda pegava no pé deles. Especialmente no de Louhi, especialmente quando ela exagerava, ele ficara sabendo do troll e os colocou em uma semana de treinamento como castigo. Ele sempre advertira, ela não podia passar dos limites, era perigoso demais.
-Por que ele só fica sentado enquanto eu estou aqui? – Louhi perguntou de ponta cabeça num galho de árvore, algumas abdominais depois das flexões e corrida era o aquecimento chato que ela tinha.
-Porque o trabalho dele é muito mais mental que físico. – Ukko falou dando uma batida nas costas delas com a bengala para incentivá-la a fazer a próxima abdominal.
-Corpo são, mente sã. – ela resmungou.
-Não há nada de errado com o corpo de Tapio, ele tem mais disciplina que você. Acabe logo essas abdominais, você tem que treinar 2 horas antes do almoço!
-Sim, mestre!
Treinamento era uma das raras ocasiões onde era possivel ver Louhi coberta por panos, Ukko a fazia usar casaco e calças compridas, Tapio nunca entendeu bem o porque, mas era sempre assim. Depois de acabar a rodada de exercicios era a vez dele ajudar, foi até uma árvore e desenhou um simbolo que lembrava um cubo se quebrando, encostou as duas mãos no tronco e fechou os olhos. Sacerdotes podiam lacrar ou liberar energia, armas como Aku e Ale só podiam ser feitas por sacerdotes experientes, para manter esse poder por muito tempo. Os selos que Louhi usava eram feitos por Tapio, mas depois de uso se tornavam cinzas.
-Ótimo, um Ent do inferno... – Louhi falou enfiando a mão no bolso, a árvore ganhara vida e começara a se contorcer.
-Não. Você está proibida de usar a Aku até depois do almoço.
-Velho maldito...
-Você precisa guardar suas forças, Aku não é um brinquedo. – Ukko falou dando as costas e indo na direção da casa – Mais um a cada cinco minutos, Tapio.
-Sim, mestre. – Tapio falou se protegendo com um selo enquanto a árvore desengonçada e retorcida ia pra cima de Louhi.
-Barreira feita?
-Claro.
-Primeiro selo, pronto...
Louhi não era como Tapio, ela tinha uma confirmação verbal própria para o que fazia ou acontecia, como se sem aquilo a realidade fosse se dissolver e tudo seria mera ilusão. Desviar de galhos saindo de galhos, que sairam de outros galhos sem dúvida não é fácil, mas a quantidade enorme de árvores por ali servia de escudo vez e outra. Por isso viviam naquele lugar isolado, assim ninguém incomodava ou se machucava. As marcas nos pulsos de Louhi mesclavam cicatrizes a tuatuagens, as vezes pareciam saltar aos olhos como veias, especialmente quando ela fazia aquilo... Pular na direção de algo e o segurar com força.
-Madeira! – ela gritou arremessando a árvore.
-Vai ter que fazer melhor que isso, Louhi. Ela ainda está mexendo.
-Não diga. – a garota falou puxando o capuz por cima da cabeça, contou antes de sair correndo. – Um, dois, três...
Tapio se sentia preocupado, às vezes, mas assistir Louhi se escondendo e se movendo sem fazer barulho, caçando e exterminando sempre era um entretenimento garantido. Ele a única pessoa na platéia, o único a fazer expressões de surpresa, susto, alivio, ou saudá-la no final. O único a ver depois que a cortina fecha, o estado enfraquecido, exausto e vazio do que resta de uma atriz que deixa sair o personagem. O tempo passava mais rápido do que ele esperava, faltavam poucos minutos para a pausa do almoço, duas árvores arremessavam Louhi de um lado para o outro, chicotadas de madeira e cortes de folhas.
-Terceiro selo, pronto. Alvo... – Louhi murmurou cravando as mãos no tronco de uma das árvores, se fixou como um parasita. – Eliminado!
-Você só tem dois minutos, Louhi!
Tapio avisou vendo a árvore ser aberta em duas, Louhi parecia cansada e os ferimentos abertos davam a ela a aparência de um animal selvagem num duelo, o peito arfando e os dentes à mostra, os olhos fixos na presa abatida. Tapio sentiu um leve receio quando a outra árvore a capturou com os galhos a mantendo presa contra o tronco, se apertasse o bastante não era díficil para uma árvore quebrar uma pessoa em vários pedacinhos. Louhi não gritou, apesar das caretas, ele preferia que ela tivesse gritado do que ver poucas lágrimas rolarem enquanto ela apertava os punhos.
-Louhi... – Tapio estava pensando em fazer alguma coisa quando um objeto maciço o acertou na cabeça. – Mestre Ukko...
-Se ela não aguenta isso, já está morta... – Ukko falou olhando para a árvore – Você sabe disso...
-Mas mestre já fazem mais de duas horas... – Tapio comentou.
-Você está enxergando, mas não está vendo a situação Tapio. Para um Guardião, bem mais que solucionar uma situação é preciso vê-la e entendê-la. Se você não entende, você não pode fazer nada.
-Claro, mestre. – ele falou olhando para Louhi e a árvore.
-Essa menina é mesmo impressionante. Em três tempos. Marcar, aproximar e por fim eliminar. – Ukko sorriu.
-Mas o que...? – Tapio não acreditava em seus olhos, Louhi tinha quebrado os galhos que as esmagavam e acabara de começar a quebrar a árvore com chutes. – Eu...
-Não precisa se sentir inútil, Tapio, você tem o seu papel. – Ukko falou vendo a árvore ir ao chão, a touca do agasalho caiu, revelando cabeços bagunçados e uma marca que dava a volta no pescoço como uma coleira, aos poucos sumindo. – Também não precisa se sentir fraco, você não é fraco...
-Só não sou um monstro. Ela me falou isso...
-Vá cuidar dos ferimentos dela e comam bem, depois vamos continuar. – Ukko mandou deixando uma cesta com comida aos pés do jovem. – E não se esqueça, você tem o seu papel... Não importa quantos monstros ela possa subjulgar, lembre-se que só você pode fazer o mesmo com ela.
-Sim, mestre.
Louhi estava físicamente quieta, se jogara sob a sombra de uma árvore e não mexera sequer um dedo depois disso, mas não parava de fazer onomatopéias fracas de dor enquanto ele limpava seus cortes e tratava seus ferimentos. Em algumas horas eles deveriam fechar com um pouco de ajuda de seus selos, mas ainda assim antes disso ela já estaria se mexendo de novo. A pele gelada dava a impressão de estar cuidando de um cadaver, mas podia ver o movimento sutil da respiração dela e os olhos cinzas olhando para o vento na copa da árvore. Não se lembrava bem, mas parecia que era só em momentos assim que ela parecia humana.
-Quanto mais selos você usar mais rápido você acaba com os inimigos, mas isso não é de graça. – Tapio comentou puxando o braço dela, havia marcas vermelhas ao redor dos pulsos. – Depois o seu corpo recebe os sinais e consequências do esforço.
-Não diga. – ela murmurou fazendo uma careta quando ele apertou seu pulso. – Não faz isso...
-Eu preciso enfaixar. – ele falou apertando de novo com as ataduras.
-Tanto tempo caçando coisas insignificantes, eu acabei esquecendo como eu me sinto depois de esforço de verdade. – ela comentou virando o rosto e fechando os olhos.
-Fala como se árvores fossem lordes demôniacos. – Tapio comentou, mas sabia que não era fácil.
-Árvores também são insignificantes, mas uma floresta é bem problemática.
Ela simulou um sorriso, os dois se alimentaram quietos na sombra da árvore, imaginando o que Ukko iria inventar para as horas seguintes. Uma cena um tanto quanto nostálgica, ela lembrava bem da primeira aula que tiveram juntos, as duplas tinham sido feitas rápidamentes e os dois sobraram, um garotinho de olhar tímido e ela que fingia que dormia de tédio afastada do resto da turma. Na primeira aula eles tinham que simplesmente fazer exatamente aquilo, ele dava vida à algo para ela tirar, mas na época eram coisas bem menores e mais inofensivas.
-Você acha que alguma coisa mudou nos últimos anos, Louhi?
-Acho, sua cabeça ficou maior. – ela respondeu tomando longos goles de água.
-Não é disso que eu estou falando. Nós ainda fazemos quase as mesmas coisas, Ukko ainda nos castiga dos mesmos jeitos e...
-Você ainda pensa demais. – ela falou sorrindo.
-Eu só imagino que talvez você viva entediada. – ele comentou.
-Eu não ficava entediada de verdade. Eu só... – ela bateu com a garrafa na cabeça dele de leve – Não é da sua conta...
-Sabe, como seu guardião você devia confiar mais em mim... – ele murmurou.
-As pessoas nem sempre fazem o que deviam.

Um comentário:

Ceci disse...

Eita,quem diria que eu veria um dia uma lágrima escorrer dos olhos de Louhi o.O"
Ta,ela tem sentimentos tbm,mas os esconde e os transmite de uma forma típica dela ne?
Acho bonitinha essa coisa dele cuidando dela,dando as broncas "de irmão",sempre protegendo da maneira dele...ahh gosto desse universo^^

Digamos q esse capitulo meio que provou um lado mais "fragil" (bota mtaaaaaaaaaaaaaaaaaaas aspas nisso =x)de Louhi,e caramba hein?O tio Ukko pegou pesado...(falando como ce-chan =X)

Queria poder ja comentar o poema mas tenho q me esforçar para no minimo conseguir lê-lo...ja ja da minha hora =S

mas sei q qndo eu voltar ja vai ter outro nee?*-*" hehehehe

bjão mo
;**