domingo, 11 de janeiro de 2009

Mestre Ukko

1
A casa era pequena, extremamente pequena, mal dava para aconchegar os três moradores, dois deles mais extensivos e o outro, bem, o outro encolhia com o tempo, como todo velho. Sentado na cadeira de balanço olhando pela janela, dando pontos em algumas roupas, cozinhando curvado sobre as chamas, ajeitando as bugigangas e ferramentas do ofício, parecia um velhinho comum, de pouco cabeço e barba branca rala, pequenos olhinhos expremidos para poder enxergar.
-Ukko! Visitas! – uma voz gritou do andar de cima, provavelmente vira chegar de longe.
-Visitas...? Sim, sim... porta... – o velhinho murmurou consigo mesmo enquanto levantava, a idade lhe doendo as juntas e deixando os movimentos lentos. Quando a porta girou só havia um homem encapuzado e cheio de blusas, como quem passa muito frio, ou se esconde – Olá. Quer vender algo?
-Estou procurando o Sr. Ukko, o Exterminador. Poderia chamá-lo? – o homem pediu, olhava por cima dos ombros compulsivamente.
-Ukko? Sim, claro, claro... – o velhinho falou saindo do caminho – Entre, por favor...
-Obrigado, senhor.
Era uma saleta modesta, um sofá jogado num canto e uma cadeira de balanço, não havia espaço para estante ou armário, mas havia um banquinho que improvisava uma mesa caso fosse necessária uma. O homem se sentou no sofá olhando pela janela, era possivel ver a trilha pela floresta que levava até a estrada, que por sua vez levava até a cidade mais próxima e a outras também. O velhinho sentou na cadeira de balanço.
-O que deseja com o Exterminador, meu filho? – o velhinho perguntou coçando a cabeça, quase como caduco sem ir fingir que chamava ou se apresentar como Ukko.
-Há um problema que achamos que ele podia resolver para nós. – o homem respondeu puxando um pouco um cachecol que usava sobre o rosto, só podia estar morrendo de calor.
-Nós? – o velho perguntou surpreso.
-Poderia chamá-lo?
-Não será necessário.
O homem encapuzado levou um susto, entrava pela porta de maneira tranquila um jovem de cabelos negros bagunçados pelo vento, usava um colar de contas justo com vários simbolos nas pequenas continhas negras, fora disso apenas uma camisa branca e uma calça jeans, tinha olhos que lembravam as contas que usava, negros com pequenos pontos brilhantes aonde a luz refletia. O velhinho soltou um sorriso se recostando sossegado na cadeira de balanço que rangia, ergueu as sombrancelhas como quem cumprimenta.
-Mestre. – o jovem cumprimentou juntando as mãos.
-Você demorou... – o velhinho falou.
-Senhor Ukko? – o homem perguntou se levantando e logo continuando nervosamente como se estivesse na presença de uma entidade – Uma honra conhecê-lo! Precisamos muito de seus serviços, por preços aceitáveis claro!
-Acalme-se, por favor. – o jovem pediu erguendo uma mão, haviam mais contas enroladas em seu pulso e mão. – Acho que se enganou. Sou Tapio, o Guardião.
-Tapio? Mas... disseram que Ukko, o Exterminador vivia aqui!
-Quanto tempo você acha que faz desde o primeiro feito do Exterminador? – Tapio perguntou com um sorriso bondoso.
-Bem... Muito tempo...
-Então esse Ukko, devia ser bem velho agora não?
O homem entendeu no choque, se virou para o velhinho na cadeira de balanço que acenou com a ponta dos dedos sorrindo. Claro, o temido e procurado Ukko era uma lenda há décadas e por mais que fossem lendas incriveis, ele era apenas um homem e o tempo era igual para todos os homens. O grande Ukko, agora era apenas um velho que mal andava na velocidade de uma tartaruga, não havia esperança. O homem se sentou na decepção, como um moribundo no deserto que descobre que o oasis é apenas areia.
-Estamos perdidos...
-Não tema, filho. – o velhinho falou tossindo. – Tire esses trapos e me diga qual seu problema. Talvez eu ainda possa ajudar.
-Vou pegar água para você mestre. – Tapio se ofereceu.
-Moro na cidade de Sirpa, a pequena cidade seguindo as trilhas que dão na colina. O ponto de troca de alguns comerciantes e aonde se produz...
-Fragmentos, conheço Sirpa. – o velhinho concordou com a cabeça pegando o copo de água que Taipo trazia, o jovem ficou em pé ao seu lado como um cão fiel.
-Há algum tempo acidentes começaram a acontecer, já tentamos de tudo para acabar com eles, mas não adiantou. Nem temos um culpado... Os últimos dois que foram buscar ajuda sofreram acidentes, por isso estou assim. Pensamos que o grande Ukko, poderia achar o culpado e acabar com ele, mas...
-Culpado de acidentes? Sempre achei que acidentes fossem... Bem, acidentes. – o velhinho murmurou pondo de lado o copo de água vazio. –Você quer a causa e que os acidentes parem?
-Claro. – o homem concordou, finalmente tirou todos agasalhos, capuzes e cachecóis, era um jovem de pele avermelhada, provavelmente pelo calor, olhos amarelados e cabelos entre o vermelho e o laranja. – Por favor, sabe quem pode nos ajudar?
-Qual seria a recompensa por acabar com os acidentes de toda uma pequena cidade, filho? De quanto estamos falando? – Ukko perguntou diretamente, antes de tudo era um mercenário.
-Um baú de fragmentos de pedra preciosa e vinte mil em dinheiro, ou depositado num banco de sua preferência. – o jovem falou o que lhe foi dito com precisão.
-Toda uma pequena cidade valendo tão pouco. – Ukko murmurou. – Acho que serve o exercicio. Tapio...
-Seu aprendiz? Ele irá matar quem causa nossos problemas? – o jovem perguntou empolgado.
-Tapio? Matar? – Ukko riu – Não, não...
-Sou um Guardião, um sacerdote e acima de tudo um ajudante. Jamais feri ou matei o que quer que fosse. – Tapio respondeu, não pareceu ofendido, apenas surpreso com o rosto animado do outro sob a persperctiva de outro exterminador. – Mas irei ajudar no que for possível, se assim o mestre quiser.
-Claro, você também vai. Chame a Louhi e vão com o jovem aqui. – Ukko comentou com gestos breves – Eles vão resolver qualquer problema que vocês tiverem, filho...
-Louhi? Uma mulher? – o jovem perguntou desconfiado.
-Louhi, não é só uma mulher. – Tapio corrigiu antes de sair da sala – Ela é uma caçadora, mercenária e Assassina.
O jovem se encolheu no sofá, como uma criança que acabara de receber bronca ou sermão dos pais, sentiu um tom ligeiramente ofendido vindo de Tapio antes que saísse da sala. Ficou ali com o velho Ukko que balançava em sua cadeira muito tranquilamente, esperando o que viria descer daquelas escadas simples. Esperava por armas modernas, talvez brutas armas brancas, quem sabe uma imagem feminina de um lutador ou militar, mas não esperava o que apareceu diante de seus olhos.
-Louhi, vá com Tapio ajudar a cidade desse jovem. Quando chegar a Sirpa, pegue um adiantamento, sim? – Ukko comentou sorrindo.
-E se ela não conseguir? – o jovem questionou desconfiado e incrédulo no sucesso.
-Você pega de volta. – Ukko respondeu simplesmente.
-É tão triste quando julgam pela aparência. – Louhi murmurou caminhando até a porta a batendo atrás de si quando saiu.
-Não se preocupe, ela não está brava. – Taipo comentou sorrindo – Tente ser mais gentil com uma dama, elas são medonhas bravas.
-Está bem, mas...
-Vamos. Louhi já deve estar na metade do caminho...
-Mas...
O jovem não entendia aquele ritmo de caminhada, Louhi andava como um fantasma, era como se apenas passasse flutuando pelos lugares, não fazia barulho e não ocupada muito espaço, como se pudesse se esconder em qualquer vão ou curva, enquanto isso Tapio era como uma sombra, parecia fazer parte de tudo, do ambiente, da estrada e até mesmo de Louhi que ia na frente. Mas não era só isso, o jovem andava bem mais devagar que os outros dois, que apesar de estarem numa velocidade considerada por muitos alta, demonstravam expressões de quem passeia despreocupadamente admirando a paisagem.
-Não... falta... muito... – o jovem estava ofegante – Esperem...
-Todos em Sirpa são como você? – Louhi perguntou sem sequer olhá-lo.
-Ahn? Sim, eu acho...
-Agora sei, porque precisam de ajuda. – Louhi murmurou baixo, apenas Tapio conseguiu ouvir, não era bem uma ofensa, parecia mais uma nota de decepção.
-Senhorita, Louhi... Me desculpe por antes, mas... Tem certeza que pode nos ajudar?
-Posso, só não decidi ainda se quero.
Finalmente ela virou para olhá-lo, aquilo não era um rosto maldoso, era meramente um rosto desafiador que parecia convidá-lo a um duelo, traços simples e fortes, a boca avermelhada tinha dentes um tanto quanto animalescos e os cabelos presos para o lado caíam em pequenas ondas. Ele não conseguiu se mexer, como uma presa acuada diante de seu predador, os olhos dela eram de um azul quase cinza e o diziam que um movimento era o bastante para ser atacado. Louhi era uma jovem, de aparência bonita para muitos, mas de hábitos e acessórios não tão comuns.
-Eu não gosto quando pagam pouco e nem sabem o que é pra ser feito. – Louhi murmurou puxando uma luva preta que não cobria os dedos, presa a sua cintura, a calçou na mão direita. – Mas por outro lado, o mestre Ukko pediu...
-O que vocês são dele?
-Alunos. – Tapio comentou gentilmente – Há um certo tempo atrás quando notou que já estava enferrujando, o mestre Ukko se juntou a outro especialistas para ensinar sucessores em seus ofícios.
-Depois que nos formamos, decidimos continuar com o mestre Ukko. – Louhi comentou com um breve sorriso – Afinal ele era nosso melhor professor.
-E vocês os melhores alunos? – o jovem perguntou impressionado.
-Segundo todos os outros professores nós éramos os piores. – Tapio comentou sorrindo divertidamente. – Mas o velho Ukko disse que só faltava vontade para Louhi e para mim motivação.
-Mas não adianta se interessar tanto, as aulas acabaram. – Louhi falou de maneira definitiva.
-Como assim?
-Os outros professores já morreram, só sobrou o Ukko e ele não ensina mais. – Taipo comentou de maneira nostálgica – E acho que ainda vai levar muito tempo para os alunos se juntarem e virarem mestres.
-Se sobreviverem... – Louhi acrescentou voltando a andar. – Chega de conversa, vamos acabar logo com isso.

Um comentário:

Ceci disse...

E eu demorei tanto pra ler essa historia!>.<
Simplesmente como disse a Ká,vc será uma ótima jornalista.E é sério,pq criatividade e expressão é o que não faltou nesse texto...
Sei la,sempre me vem a mente algum filme,ou qq coisa do tipo,desta vez me lembrei de Karatê Kid,do senhorzinho^^

Ah!E ja ia me eskecendo mããs lembrei:gostei que nas entrelinhas vc ainda deu uma liçãozinha de moral nakeles que vão só por aparência.Gostei disso...
Mais uma mulher que se diferencia por sua garra,superioridade ou seja o que for =)

Pelo que vejo essa vai ter continuação SIM \O/
e aki estou eu na ativa novamente pra ler tdinho!
bjãoo mo
;**