segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Incomum

7
-Perdão... – foi tudo que Tapio conseguiu exclamar fechando a porta do quarto, ficou de costas para ela esperando Louhi se vestir, parecia ter passado uma eternidade debaixo do chuveiro. – Achei que estava deitada...
-O que foi? – ela pareceu não se importar, um tom de voz frio e distante se encaixou em sua garganta. Ela engoliu em seco tentando fazê-lo sumir.
-Temos visitas incomuns...
-Incomuns?
-É, do tipo que não nos visita normalmente. – Tapio reformulou e quase caiu no chão quando ela abriu a porta. – Você está bem, Louhi?
-Estou. – ela respondeu com um sorriso pontudo.
-Qual é a da corrente?
-Você não quer saber... – ela respondeu gesticulando enquanto descia as escadas, ele ainda não se acostumara com o tilintar, era um som novo.
Não havia ninguém na sala, mas do lado de fora se instalara uma mesa de chá, havia uma garota jovem de cabelos ruivos cacheados sob uma sombrinha, usava trajes antiquados e luvas, lembrava uma boneca, ao lado dela de pé um homem vestido como um mordomo de barba bem feita olhava com suspeita para Ukko que servia o chá. Louhi podia notar de longe que aqueles dois não eram humanos, não apenas pela estranheza de suas aparências, mas também pelos detalhes mais sutis. As unhas afiadas do mordomo, os dentes salientes da garota, o cheiro que o vento trazia quando batia na direção da casa.
-Louhi, junte-se a nós... – Ukko chamou.
-Um prazer conhecê-la, Louhi. – a garota falou com um sorriso – E um prazer revê-lo, Aku...
-Velha conhecida? – Louhi perguntou em voz alta.
-Algo parecido. – Ukko e Aku responderam ao mesmo tempo.
-Agora entendo porque Tapio parece tão preocupado e cuidadoso com você. – ela comentou tomando um gole quase infimo do chá que lhe foi servido. – Você tem olhos capazes de domar um lobo, mas o corpo aparentemente frágil de sua presa.
-Falando em lobos... – Louhi murmurou se virando para o mordomo.
-Adawolf é um leal amigo e companheiro de vivência, não fará nada contra vocês a menos que provocado. – ela interveio sorrindo por debaixo da sombra para o homem que sorriu brevemente de volta. – Sou Emma e espero que possamos chegar a um acordo.
-Certamente que podemos. – Ukko falou sorridente ao mesmo tempo em que Tapio se juntava a eles – Não há motivo para que isso não aconteça...
-Ouvir isso de quem matava sorrindo tantos semelhantes soa irreal. – Adawolf falou pela primeira vez, parecia um rosnado.
-Eu já me aposentei...
-Creio que terá que suspendar a aposentadoria, não me leve a mal, não estou subestimando seus alunos. Mas é muito diferente explodir trolls e o que viemos aqui discutir... – Emma falou de maneira muito séria, Louhi imaginou se ela sabia da bazuca para ter dito aquilo.
-Isso é impensável... – Tapio comentou, mas foi cortado por um gesto de Ukko e Louhi.
-Vampiros e Lobisomens estão entre os monstros de classe mais alta, não é impensável que tenhamos trabalho com eles... – Louhi comentou soltando um longo suspiro – Se fosse algo simples, vocês mesmos teriam resolvido, não é mesmo?
-Claro. Mas apenas vocês não seram o bastante, então a caminho daqui chamei mais alguém. – Emma falou com um sorriso.
-Olá crianças. – Lahja cumprimento abraçada ao seu cajado. – Mestre Ukko, você não mudou nada...
-É tão ruim assim? – Ukko perguntou com um ar sombrio.
-Temo que seja, mestre. – Lahja falou baixando o rosto – Ruim e triste... Vocês podem se lembrar dos melhores alunos dos antigos mestres?
-Não vai dizer que eles morreram! – Louhi exclamou se aproximando.
-Acho que na concepção de vocês, aconteceu algo muito pior... – Emma comentou com um sorriso afiado – Muito pior.
-Entendo. – Ukko murmurou fechando os olhos por um momento.
Todos se lembravam bem, os alunos que sempre eram os primeiros a receberem elogios, também foram os primeiros a exercer suas funções. Ukko dizia que eles eram bons demais para serem reais e que algum dia tudo iria desmoronar como uma grande mentira, dá pra ver que ele estava certo. Já tiveram muitas tarefas estranhas, mas caçar seus antigos colegas de aprendizado era a mais bizarra de todas, fazia Louhi pensar se um dia ela não seria a caçada, se um dia pediriam a cabeça de Tapio numa bandeja.
-Não tenha esses pensamentos, Louhi. – Tapio murmurou para ela. – Você sabe que essa situação pede isso...
-E o que nos impede de acabar nessa situação? – Louhi retrucou.
-Nada, mas não seria muito divertido... – Aku comentou dentro da mente dela. – Eu prefiro você viva Louhi.
-Tudo começou com a caça ao meu irmão, não guardo nenhum rancor quanto a isso, os asseguro. – Emma falou colocando o chá de lado – Aqueles dois fizeram um bom trabalho ao matá-lo, mas óbviamente o acabamento foi atrapalhado e permitiu que todo aquele trabalho não valesse nada. Ensio, é esse o nome?
-Sim, o primeiro da turma. – Lahja concordou com a cabeça. – Sua guardiã é Brita.
-Ele perdeu completamente o controle e agora é uma ameaça não só a demônios como eu e Adawolf. – Emma falou sériamente, tinha algo em seus olhos que lhe dava um ar de autoridade – Todos meus empregados foram massacrados e Brita incapaz de reajustá-lo ou matá-lo juntou-se a ele.
-E você quer que nós façamos isso? – Ukko perguntou sorrindo.
-Me parece bastante razoável, uma vez que você ajudou a fazê-los como são, mestre Ukko, o Exterminador, seja você quem os mande pro inferno. – a garota concluiu se levantando de maneira lenta – Eles estão devidamente presos em minha mansão, mas não por muito tempo. É tudo que farei para ajudá-los.
-E o que ganhamos com isso? – Ukko insistiu.
-O prazer de salvar a alma de seu companheiro da maldição eterna. Lahja tem o endereço, espero que aproveitem a viajem.
Emma se afastou como algum membro da realeza, Adawolf lhe cobria a retaguarda a seguindo há alguns passos de distâncias, ambos impessoais e indeferentes ao que seria feito a seguir, mas havia algo de compreensivo na forma como trataram do assunto. Muitos teriam simplesmente deixado Ensio e Brita fazerem o que quisessem, aquilo preocupou Louhi por um momento, era como se em sua desumanidade Emma fosse mais humana que ela. Sentiu o toque de Tapio a chamar, assistiu Ukko ir pegar suas coisas e Lahja juntar as mãos como que empolgada com a perspectiva.
-É bom ter companhia nos trabalhos para variar. – ela comentou sorrindo – Uma pena que seja em condições tão tristes.
-Ensio sempre pareceu tão forte e seguro, não consigo imaginá-lo perdendo o controle.
-Tapio, somos todos humanos, estamos sujeitos a esse tipo de coisa. – Lahja comentou de maneira sutil – Ainda bem que não fui eu, vocês teriam o dobro do trabalho...
-Isso não é bem verdade, Lahja. – Louhi comentou parecendo sentir-se aliviada – Você é só uma, apesar de ser muito boa nos dois principios, ainda assim... É só uma. E considerando que Brita não fez o que devia, estamos na mesma.
-É, a responsailidade é de Brita. – Tapio concordou pesaroso.
-Pode a culpar, Tapio? Você sabe bem o peso que um Guardião carrega, acha que conseguirá carregá-lo na sua vez? – Lahjah perguntou sem hesitar.
-Pra mim é mais fácil. – Tapio falou baixando o rosto e começando a se afastar – Louhi sempre me manteve a bons palmos de distância...
-Mesmo assim ele nunca a mataria... – Aku comentou como quem ri.
-Como é possível? – Lahja murmurou vendo Louhi também se afastar, a resposta veio de Ukko que retornava de dentro da pequena casa. – Mestre...
-É preciso unir-se na hora certa, caminhar lado a lado enquanto possível e quando o momento pedir... É preciso a coragem de cortar todos os laços, incluindo o da vida. – Ukko falou sorrindo. – Nós os ensinamos para isso... Distantes como se mantém é mais dificil cumprir seus trabalhos agora, mas o fazendo... a assassina dá ao guardião a chance de realizar mais fácil seu trabalho mais tarde.
-Ela se mantém longe de propósito?
-Para não acabar como Brita e Ensio, sim. – Ukko comentou com um sorriso – Desde crianças, eu sabia que eles acabariam assim...Louhi também.
-Como, mestre?
-Se você consegue mais que os outros, você se testa mais que os outros.
-Ego? Acha que ele acabou assim para testar seus próprios limites?
-Eu acho que ele calculou mal seus limites. Assassinos, devoradores... O pesadelo dos demônios. – Ukko deu uma risada breve – Ensio devia ser mais sábio do que mexer com vampiros. Nunca é saúdavel jantar com um vampiro...
Lahja seguiu com Ukko, enquanto isso Louhi e Tapio iam na frente, separados por alguns palmos seguros e o frio presente no ar e nas correntes entre Louhi e Aku. Apenas um silvo distante do vento se fazia presente pelo caminho, apenas a solidão da despedida do dia saudando a escuridão. Chegar a antiga casa de Emma era como visitar um daqueles filmes de época, o portão de ferro antigo, a construção de séculos passados, o jardim que provavelmente exigia a atenção de várias pessoas, tudo nostálgico e trágico na escuridão do luar entre as nuvens.
-Eu preferia um vampiro... – Tapio comentou.
-Nós não escolhemos nossos trabalhos. – Ukko falou puxando a bengala para perto do rosto, a usou para ajeitar um par de óculos que pegara por algum motivo. – Apenas como os realizamos.
-Mestre Ukko... – Lahja chamou com um gesto. – É melhor não irmos todos de uma vez.
-Dividir e conquistar, achei que isso fosse uma estratégia para aplicar ao inimigo, não para nós. – Tapio interveio.
-É melhor assim, eu e Tapio vamos atrás de Brita... Lahja e Ukko podem cuidar de Ensio.
-Não, Louhi. – Ukko falou batendo de leve com a bengala no ombro dela. -Você e Lahja vão até Ensio, eu e Tapio cuidaremos de Brita.
-Você quer que nós...
-Quero que vejam a queda do que vocês são. – Ukko falou chamando Tapio com um gesto.
-Eu vou servir de guardiã para você por enquanto, Louhi. – Lahja falou segurando a mão da outra, por algum motivo a mulher sentiu um desconforto. Louhi e Tapio pareciam ter-se acostumado a conviver com a idéia de que um dia um mataria o outro.
-Como se você precisasse de algo além de mim... – Aku resmungou.
-Não é comigo que eu estou preocupada, Lahja.
-Perdão?

Um comentário:

Ceci disse...

Aeeew,finalmente isso resolveu coloborar comigo e abriu bonitinho xD

A situação ta mais complicada.
A cada capítulo,percebe-se que os trabalhos vão se complicando mais,o grau de dificuldade aumenta e as surpresas aparecem,pq nunca que eu ia imaginar que eles teriam que matar seu "próprio futuro" ou então fazer parte de uma situação que pode se repetir la na frente,mas com outros personagens...uma coisa que não quero nem imaginar pois não cabe aqui na minha cabeça a idéia de Louhi e Tapio se matarem,dps de tds akeles gestos minimos mas significativos de cuidados e preocupações fraternas um com o outro.

Mas é com as dificuldades e os obstáculos que se aprende a viver né?Então vamos ver no que vai dar essa viagem para a casa de Emma (que aliás teve uma descrição mtooo show,com detalhes que me fizeram ver a criatura na minha frente daquele jeitinho,como uma bonca de porcelana msm ^^).

Vamos para o 8?=D

bjãoo