domingo, 23 de novembro de 2008

Carreira...

4.
Depois do dia feliz no parque, o cotidiano voltou, perguntas que ela não sabia responder e momentos de irritação, falta de tato da parte dele ou o problema era ela? Não sabia explicar, mas com o tempo de sentia mais em casa, mesmo que fosse só até seu ultimo desejo. Beg aparecia regularmente, lhe abraçava e apertava, fazia carinho em sua cabeça e agia como se ela fosse um tipo de mascote ou coisinha fofa apertável, já estava se acostumando e até que gostava da presença da mulher. Pelo menos na maior parte das vezes...
-Beg, é você? – Claudia perguntou ouvindo barulho do outro lado da porta, quando abriu cobriu a boca com as mãos e os olhos arregalaram – Beg! Você está bem?
-Estou... – a loira respondeu tirando a blusa completamente ensanguentada.
-O que aconteceu? Você precisa ir pra um hospital!
-Eu estou ótima, obrigada por se preocupar, anjo. – ela falou, a pele lisa apesar de manchada não mostrava nenhum ferimento enquanto ela se trocava. – O sangue não é meu...
-O-O... que... – Claudia andou pra trás, sentiu medo, muito medo.
-Não precisa se assustar, Claudia. Está tudo bem... Vem cá... – mas Claudia saiu correndo das mãos estendidas da outra. – Claudia não foge!
-Fica longe de mim!
-Claudia! Você não entende!
-PARA!
Claudia foi derrubada no chão, Beg se jogou em cima dela e a segurava pelos braços, a garota esperneava e chacoalhava o rosto completamente apavorada, tanto sangue não podia ter vindo de lugar nenhum! Beg estava ofegante de persegui-la pela casa, demorou a falar e era dificil segurá-la agindo daquele jeito, onde estava Will? Ele seria útil, devia conseguir segurar Claudia com uma mão só.
-Se acalma, Claudia! Eu não vou te fazer mal...
-Eu não confio em você!
-Anjo! – Beg gritou e encarando com um sorriso, continuo de maneira mais calma – Eu sou incapaz de fazer mal a você, por favor se acalme. Eu gosto muito de você, Claudia, e se você deixar eu explicar, talvez você ainda goste de mim...
-Mas...
-Não precisa ter medo... – Beg deu um beijo caloroso na testa de Claudia que sentiu o corpo todo relaxar, Beg era uma pessoa tão calorosa. – Não fica assim, anjo. Está tudo bem...
-Aquele sangue todo... – Claudia começou a chorar, não podia evitar.
Beg acabou por ver o que fizera Will conceder três desejos aquela menina, os olhos brilhando em lágrimas e os caixos bagunçados, aquela cena meiga e triste era tão linda que doía. A mulher levou Claudia abraçada até um canto, ficaram as duas sentadas no chão, com Claudia abraçada sendo consolada pelas mãos delicadas e leves de Beg, parecia uma criança sendo ninada, se sentia uma criança.
-O Will te contou o meu trabalho?
-Mais ou menos... – Claudia respondeu com a voz fraca.
-Eu e o Will, somos do mesmo ramo, mas temos clientes diferentes por assim dizer. Ele presta serviços a pessoas bem melhores... – Beg murmurou lamentando-se.
-Serviços...?
-Você acredita em último desejo, Claudia? – Beg perguntou e a menina fez cara de quem não entendia a pergunta – Não importa, não acontece com todo mundo, mas... Antes de morrer, algumas pessoas tem direito a um último desejo. Ou dois, ou três, depende de quem os oferece.
-Eu não entendo...
-Nós somos como espiritos, Claudia, eu e o Will. Nós escolhemos pessoas perto da morte e realizamos seus desejos antes que elas morram, o último que realizei acabou morrendo comigo ainda por perto por isso eu estava ensanguentada. – por que ela não sentia medo? Por que não gritava? Por que não corria? Estava petrificada. – Entendeu, anjo?
-Três... Desejos...
-Eu sinto muito, anjo. Ninguém devia ser avisado antes da hora, mas eu não suportei você com tanto medo de mim. – Beg falou fazendo carinho em Claudia.
Ela ia morrer? Simples assim? Tão jovem? Sem causa ou razão aparente? Simplesmente dormir um dia sem acordar no segundo, sem perguntas e sem respostas, sem nada! Uma imensidão, tantos sonhos altos que jamais ia alcançar, acabaria despencando para sempre. Se agarrou a Beg com lágrimas que congelaram dentro de seus olhos, não queria morrer, por mais que não tivesse nenhum grande plano, ou resposta para sua vontade, queria viver. Não queria simplesmente sumir desse mundo, sem mais nem menos, com ou sem três desejos.
-Como...?
-Nem nós podemos dizer... – Era a voz de Will, de pé olhando as duas no chão, olhava para as manchas de sangue no corpo da irmã e para as lágrimas nos olhos de Claudia. – Que idiotice contar pra ela.
-Will eu... – Beg começou a falar mas levou um tapa forte e alto na cara, seu rosto virou vermelho vivo onde Will acertou.
-Nunca mais se meta no que não lhe diz respeito. – ele ralhou.
-IDIOTA! – Claudia gritou virando um tapa na cara dele que tinha abaixado para bater na irmã, purpura de raiva – Só covardes batem numa mulher, sabia?!
-Parem com isso os dois! – Beg falou ficando entre os dois raivosos – É minha culpa tudo isso, e eu sinto muito, irmãozinho. Por favor, não fique brava com ele, anjo... Não deixe minhas mancadas afetarem vocês tanto, está bem? – ela deu um beijo na bochecha de cada um – Eu tenho que voltar ao trabalho...
Depois que Beg foi embora um silêncio sepulcral, termo adequado, se instalou. Will sentou no chão de frente para Claudia e os dois ficaram lá, numa mistura de olhares e desvios de atenção, por quanto tempo exatamente ela não sabia dizer, era tudo surreal demais, imaginar que existiam pessoas ou criaturas que realizavam desejos aos que iriam morrer, de acordo com o julgavam adequado. Clientes diferentes, que tipo de pessoas Beg devia visitar e realizar desejos? Quanto tempo será que ela tinha para descobrir o que desejava mais que tudo antes de morrer?
-Pare de pensar nisso. – Will falou finalmente quebrando os pensamentos de Claudia ao meio.
-É engraçado, eu nunca achei que fosse morrer tão cedo. – Claudia falou enxugando uma lágrima que caiu por acidente.
-Para...
-O que? – Ela perguntou esfregando os olhos.
-Para agora... – do que ele estava falando? E estava muito sério também.
-Por que ta me mandando parar? – ela não entendia.
-Porque se você não parar agora, eu não vou me controlar...

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