quarta-feira, 15 de outubro de 2008

5- Corpos frios


-Aquela escória invadindo nossa casa, sempre soube que era um criminoso!
-Cale a boca! – Adelheid gritou e depois tampou a própria boca sem acreditar em sua coragem e tolice.
-O que disse?
-Você me ouviu mamãe! Souru jamais fez nada para alimentar essa sua lingua venenosa!
-O que diabos ele fez com você pra me responder assim? Não me diga que está se envolvendo com aquele... aquele... – a Baronesa agarrou a filha pelos braços.
-E se estivesse? – Adelheid perguntou se soltando da mãe e correndo escada abaixo – Se um dia morder os lábios há de morrer engasgada no teu próprio veneno... – falou antes de sair de casa batendo a porta atrás de si.
Não sabia exatamente o que estava fazendo quando deixou a baronesa blasfemando e amaldiçoando presa em seu próprio castelo, nem sabia o quanto a Rainha das Mariposas podia ser cruel e engenhosa, mas partiu rua afora negando coche ou companhia dos serviçais. Seus pés a guiaram aonde seu coração desejava ficar, na prisão de vidro onde ela encontrava a liberdade da vil baronesa, alcançou ao portão Souru que parecia caminhar muito mais calmamente que ela.
-Senhorita Treveau, posso lhe ajudar? – ele perguntou a notando ofegante vindo em sua direção.
-Eu... – a falta de ar lhe cortava as palavras.
-Está palida, algo lhe aflige? – ele tocou a testa dela procurando sinal de febre e ela entendeu como ele conseguia levar borboletas para Letia, tinha as mãos tão leves que seriam incapaz de ferir mesmo a criatura mais frágil.
-Posso entrar? – ela perguntou com os olhos enevoados pela incerteza e baixadas as emoções sentia medo das reações que a mãe podia ter.
-A senhorita Borboun repousa a esta hora, receio que lhe falte companhia adequada. – ele respondeu baixando o rosto, mas abrindo o portão.
-Sua companhia me basta... – ela corou enquanto entrava evitando olhá-lo.
Sua mente cobria-se de dúvidas, como por quais motivos covardes mantera distância dele todos aqueles anos e agora o via assim tão inocente e inofensivo, gentil e morno em seu modo servil como se não aspirasse nada mais em sua vida. Ele a acompanhou até a sala e lhe serviu chá morno para acalmar os nervos, permaneceu silêncioso a observar como todo bom guardião, ela estava encabulada demais para quebrar o silêncio quando decidiu falar a primeira coisa que lhe passou pela cabeça:
-Pensa em fazer outra estátua? Eu vi a da professora de piano que agora fica no conservatório, é muito realista.
-Me faltam modelos... – Ele respondeu parado na porta, parecia uma gargula vigiando uma construção antiga.
-A professora gostou de seu trabalho?
-Nunca mais a vi. – ele respondeu se aproximando um passo – Gosta de estátuas?
-Acho que você tem muito talento, mas prefiro pinturas... Elas são mais mornas.
-A pedra é fria, é verdade. – ele concordou e desviou o rosto, Adelheid temeu ter-lhe ferido os sentimentos e se adiantou na direção dele – Mas você não pode sentir uma pintura...
-Sentir?
-Venha... – ele estendeu a mão para ela.
Ela temeu por um momento, o velho receio que a mãe lhe incrustrara, mas logo estendeu a mão para ele que a guiou pela casa. Ela reconheceu o caminho até a redoma de vidro, onde ficavam a maior parte das estátuas e também as borboletas, nunca a tinha visto sob a luz do luar e das luminárias espalhadas pelo jardim entre flores e árvores. As borboletas ficavam mais calmas, com poucas exceções que ainda circundavam à fonte, ele a levou para um canto onde a estátua do jardineiro ficava reclinada na direção de uma roseira.
-Se eu o pintasse colhendo uma flor, ou até mesmo regando uma muda ele não sentiria as pétalas sobre seus dedos... – Souru comentou se abaixando e encarando o velho jardineiro, Adelheid lembrava dele, um senhor risonho que sumira pouco depois da redoma estar pronta.
-Mas é só uma estátua... – ela não entendia.
-Uma estátua é um corpo frio e sem vida, eu sei... – ele falou se levantando e a encarando, na escuridão parecia que os olhos dele sugavam como abismos. – Mas não é diferente dos corpos sem vida que existiam antes das almas aportarem dentro de si...
-Está falando do conto de novo? – será que ele via o mundo tão irreal quanto transparecia naquelas palavras?
-Não. Estou falando de corpos frios, mas que para sentirem cada toque, perfume ou sabor basta um pouco de compaixão ou da essência da própria vida. Coisa que falta em muitos daqueles que vivem e acabam se tornando corpos quentes com almas frias... – ela deu um passo para trás – Eu te assusto?
-Às vezes... – ela confessou apertando as mãos.
-Entendo, perdão... – ele fez uma mesura se afastando.
-Souru! – ela chamou e ele parou para olhá-la na escuridão – Às vezes... Eu sinto que minha alma esfria dentro do meu corpo, como uma flor que murcha sobre a estante ou então...
-Uma borboleta que se debate até a morte dentro de uma jarra. – ele falou sorrindo.
-Um dia... Mesmo uma alma calejada como a minha pode se libertar e voar? – ela perguntou sentindo que choraria, ele se aproximou lhe limpando o rosto úmido. – Eu queria...
-Se você quiser... – ele falou segurando o rosto dela com ambas as mãos, lhe beijou a testa e então a encarou com um sorriso tenro – Eu posso te libertar. – o toque dele era tão leve que ela própria sentia seu peso diminuir, sob as mãos deles eram como retirar os fardos que a prendiam ao chão, apenas sorriu concordando com a cabeça.

Um comentário:

Ceci disse...

Não sei pq(aliás acho que até sei) to me identificando cada vez mais com essa história...aliás,eu to tendo uma ligação com as benditas que eu morro de medo xD

Nesse capítulo,o momento em que Adheleid "se liberta",grita com sua mãe e sai de casa,simplesmente foi meio "mágico" pq esse é o desejo de mtos que não conseguem esse feito e ficam presos aos medos que sempre carregam consigo...Tá,nada de começar a falar de particularidadese vamos retomar o capítulo^^

Eu gosto qndo vc começa dar esses novos rumos...rumos que nos levam a acreditar numa possivel,futura,linda junção de personagens xD
E se isso acontecer com os 2,com certeza mtos problemas ainda irão acontecer e eles terão de enfrentar mtas coisas...mas ele -apesar de ser meio frio,distante na maior parte do tempo- conseguiu mostrar um pouco do que ta guardado em sua alma...tda essa compreensão,essa fragilidade para com as coisas e pessoas que o consideram,enfim,uma boa pessoa e mto misteriosa...mas creio que a amizade dela fará mto bem a Adheleide^^

Chega de escrever pq eu sei que o 6ja me espera la hahahaha

;***