sábado, 25 de outubro de 2008

Doze meses tem um ano...

XII
Ela nunca tinha ido até ali antes, sabia que a empresa dele era dona do prédio, um hotel de luxo, mas nunca tinha ido até ali apesar de já terem jantado no restaurante. A cobertura era um apartamento da mais alta classe, cheia de fotos em porta-retratos, todas da mesma mulher morena que aparentemente gostava de vermelho, caía bem nela. May sentiu um arrepio lhe subir a espinha quando desceu do elevador e assistiu Lochan ir se servir de uísque de um dos armários como se estivesse em casa.
-Você já se perguntou por que eu nunca a pedi em casamento, May? – ele perguntou fechando a garrafa e virando o copo, como ela não respondeu ele continuou – É que legalmente eu ainda sou casado. – e apontou para as fotografias.
-Sua esposa é linda... – Foi tudo que ela conseguiu dizer.
-A minha prostituta é mesmo linda. – ele concorcou e May arregalou os olhos em choque.
-Lochan...
-Não se preocupe, ela não pode ouvir. Venha... – ele a chamou com um gesto de sua mão a guiando pelo lugar – Minha prostituta é tão linda, que o meu ex-sócio não conseguiu manter as mãos fora dela. O resultado foi que eu fiquei sem sócio pouco tempo depois...
-O que aconteceu com eles? – May perguntou com a voz trêmula.
-Você acha que eu os matei? – ele perguntou parando para a encarar, aquele tom e olhar, tudo dizia que sim.
-Não.
-Claro que não, seria bom demais pra eles. – ele falou indo na direção de uma porta, pegou a chave que ficava atrás de uma fotografia emoldurada. – Eu o levei a miséria em pouco mais de três meses, ele acabou suicidando.
-Por que não se divorciou e esqueceu tudo? – May perguntou o vendo virar a chave.
-E deixar ela se livrar? Nunca. Eu faço questão de atormentar ela até o fim da vida, aliás depois de algum tempo ela bem que queria que eu a tivesse matado de ciúmes.
-Por que ser tão cruel?
-Porque eu posso. – foi o que ele respondeu abrindo a porta – Não que eu goste, mas eu posso...
-Meu Deus... – ela levou as mãos aos lábios.
O quarto era bonito, parecia ter sido decorado cuidadosamente e era bem cuidado, mobilias que eram verdadeiras antiguidades, ela notara pelas fotos a época discrepante, tanto retro contrastava com o soro e os monitores cardiacos ao lado da cama. Uma senhora, já idosa deitada, rugas e cabelos brancos, mas ainda guardava algum ar de sua graça, parecia bem cuidada.
-Olá, minha puta... – ele cumprimentou tocando de leve as mãos da velha que acordou, o olhou com o olhar mais pesado de dolorido que May jamais vira. – Ela já não é mais tão bonita. Foi minha primeira mulher...
-Como pode, todo esse tempo... – ela não queria entrar no quarto.
-Você sabe o que é descobrir que a mulher que você ama não chega nem ao menos a ser um tipo aceitável de ser humano e não conseguir deixar de amar ela? – Lochan perguntou acariciando a cabeça da mulher que começou a chorar. – Shhhh, não se preocupe Marie você não vai viver muito mais tempo, logo você vai poder descansar em paz. – ele se virou para May com um sorriso – A coitada parou de sair de casa um mês depois do suicidio, eu a atormentei tanto que em um ano ela não falava mais. Mas eu cuidei para que ela vivesse por todo esse tempo...
-Eu pensei que você tivesse dito que a amava. Como...? – ela queria fazer perguntas, mas sentia um nó desconfortável na garganta.
-Eu a amei sem dúvida, mesmo depois de todas as traições. – ele falou se sentando ao lado da esposa na cama, segurava a mão dela entre as suas, mas seus olhos estavam em May, parecia uma criança por um momento. – Amar, sempre. Perdoar, nunca. Ela é um aglomerado de caracteristicas que eu odeio, então eu decidi que não ia gastar sequer um dia da minha vida até encontrar uma mulher que merecesse meu amor num nivel aceitável...
-Então você...
-Eu procurei... – ele falou sorrindo – Por décadas até achar você, May. Você que além de tudo fica horrivel de vermelho... – ele deu risada por um momento.
-Você não envelheceu que nem ela, porque passou esse tempo todo sem viver... – ela comentou com uma risada nervosa, remexia seus cabelos e ajeitava a saia, se aproximou um passo. – Lochan...
-Você me deu uma perspectiva de vida, May. E eu quero viver essa vida com você, mas você precisa saber que você me pertence.
-Eu sei disso, meu amor... – ela falou o abraçando junto ao peito, lágrimas escorriam de seus olhos por acidente.
-Eu morro de medo sabia? – ele perguntou largando a mão da vagabunda e abraçando sua doce amante pela cintura. – Desde aquela época eu morro de medo de me enganar, por isso eu calculo, análiso... Eu morro de medo de perder a mulher que eu amo e isso me irrita ao ponto do ciúme me entortar os pensamentos.
-Não precisa ter medo... – como ela podia consolá-lo? Pensara em apresentá-la a prostituta já há algum tempo, achara que ela ia ter medo, chorar, querer fugir. Mas ela o consolava ao invés de temer. – Você não vai me perder... E eu não quero perder você também.
-Perder? – ele falou rindo. – Eu não te deixaria fugir nem que você quisesse... – ele olhou de soslaio para a velha na cama, ela chorava. – Já não percebeu?
-Eu não sou ela, Lochan... – May falou o puxando pela mão, era a primeira vez que sua voz era tão séria, o afastou da cama – Pare de análisar e comparar, eu não sou ela.
-Eu sei disso.
-Isso é passado, já está na hora de você enterrar ele. Você é meu agora... – ela o beijou, como podia... Como podia? Sem medo, sem remorso. Ela estava tão segura assim do que queria? Ótimo, já era tarde para se arrepender. A porta fechou depois dela tirá-lo de lá, o apito inconstante do monitor cardiaco virou um apito único e continuo. – Não me importo se é até que a morte nos separe...
-Não, May. – ele falou dando risada, socou a fotografia na parede ao lado quebrando o vidro, seu olhar fixo nos olhos de madeira dela. – Nada nos separa, é tarde demais.

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