sexta-feira, 5 de setembro de 2008

7. Música maestro

-Eu ainda costuro a boca do Ângelo, gritando daquele jeito logo de manhã! – Beau estava irritada, mas Mika podia entender. O colega gritava cada vez mais depois que uma aluna do primeiro ano sumiu no caminho pra casa.
-Ainda não encontraram ela?
-Não, mas ela não estava com ninguém da nossa turma naquele dia. – que bom, era só ela ter respirado perto do Korone e ele já seria o maior suspeito, apesar de toda noite ele poder se alimentar de Rinmotoki ele ainda saía com várias garotas. – Talvez seja um seqüestrador qualquer, você devia tomar cuidado...
-Eu?
-Mika, você tem aquela casa enorme e por mais que possa se cuidar de noite... – Beau estendeu a mão segurando o braço da amiga, as unhas cresceram arranhando de leve a pele da outra – De dia você continua sendo muito frágil, sabia?
-Não tem problema eu não volto pra casa sozinha...
-Que?
-O Korone entrou em todos os clubes de esportes possíveis, então ele acaba indo pra casa no mesmo horário que eu.
-Então o Korone te leva pra casa todo dia? – Beua perguntou num quase grito de espanto.
-Korone?
Ele tinha surgido do nada, o corredor vazio tinha ficado lotado numa fração de segundos e ali ao lado delas estava Azure de pé com uma pasta cheia de partituras. Como ela sempre saía correndo pra evitar sequer chegar perto do por do sol desde o incidente com o sorvete ele nunca a via indo embora com o Korone, mesmo que visse ela ignorava qualquer problema em relação a isso.
-É, ele mora comigo... – Beua beliscou a cintura de Mika com força que soltou um grito.
-O que ela quis dizer é que ela aluga um dos quartos da mansão pro Korone e pro Ângelo. O lugar é imenso, eu mesma devia alugar um quarto lá já que é bem mais barato... – Beau interveio com uma risada nervosa que Mika achou completamente sem propósito.
-Que bom, eu estava começando a ficar preocupado com você voltando sozinha pra casa, Mika. – Azure falou sorrindo, um sorriso gentil e simples. Preocupado com o que? – De qualquer jeito eu só vim lhe trazer isso. – ele estendeu a pasta para ela.
-São as músicas que eu vou cantar? – Mika perguntou olhando as notas, palavras e outras dezenas de símbolos, dos quais já ouvira falar, mas não lembrava o que queria dizer nem metade.
-São. Eu espero você mais tarde, então...
-Até mais tarde.
As aulas foram totalmente desperdiçadas, guerras em meio mundo de distância ficaram pra seus países de origem e números na lousa deixados para os matemáticos que os quisessem. Folheava as partituras enquanto imaginava que tipo de apresentação não seria aquela quando estivesse pronta dali a pouco mais de dois meses, muitas músicas do coro e algumas solo, um único dueto era o gran finale. Naquele dia todo o grupo de música ensaiava junto e por mais que tivesse aprendido muito ainda se sentia o patinho feio no meio de tantas vozes e instrumentos melhores afinados.
-Música, Maestro...
E começavam os ensaios, por algum motivo que ela não conseguia distinguir só conseguia acompanhar dois sons de todos os produzidos, o primeiro era o do piano com o qual Azure tentava lhe ensinar continuamente sobre notas, oitavas e tudo mais, o outro era o choro afinado do violino, que por mais que a música fosse agitada lhe parecia sempre um som triste. Ensaiavam apenas as músicas do coro, Azure lhe falou que podiam ensaiar o solo e o dueto depois, cantava distraída, sentindo o som do piano se entrelaçar ao violino, até que silêncio enchia a sala no final da música. A pausa era anunciada e um murmúrio ia crescendo dentro do silêncio.
-Muito bom pra primeira vez.
-Não foi tão mal assim, logo você vai acompanhar todo mundo...
-Se quiser eu posso te ajudar...
Palavras e mais palavras jogadas com as quais ela apenas sabia responder com gestos soltos, sua garganta estava seca e a água parecia sumir antes de causar qualquer alivio. Durante o intervalo os ensaios foram interrompidos, um professor mandou todos para a casa depois da noticia de que mais uma aluna sumiu. Grupos se formaram automaticamente com pessoas que moravam perto umas das outras, Mika continuou no mesmo canto onde estava juntando suas coisas.
-Mika, posso lhe acompanhar até em casa? – Azure que perguntava ao lado do piano.
-Não precisa se preocupar, ainda é cedo e não é longe. – Mika sorriu – E eu...
-Desculpa, eu me esqueci.
-Desculpas? – ela não entendeu nada.
-O Korone mora com você então ele deve lhe acompanhar, não é? Eu tinha esquecido, então não preciso me preocupar... – ele coçou os cabelos. – Até amanhã.
-Até...
Dobrou as partituras repassando mentalmente as letras das músicas enquanto caminhava até a saída do colégio, Korone não estava entre os que cruzavam os portões, nem procurou por ele. Mandou mentalmente o maestro começar a tocar e foi cantarolando enquanto caminhava, algumas esquinas depois a maioria já teria passado para outros caminhos, ela morava numa região diferente da maioria. Cantarolando baixinho, até a música acabar e restar o silêncio. O silêncio depois de uma pancada contra a parede, metal refletia a luz do sol.
-Fica quieta... – uma ponta de faca? Parecia. Nunca tinha visto aquele homem antes, mas não era diferente de qualquer ladrão ou mendigo de filme ou tv. – Se você gritar eu te mato entendeu? – a rua estava vazia de todos os lados, a ponta da faca no seu pescoço fez escorrer uma quantidade ínfima de sangue que lhe atiçou os sentidos.
-Sim... – foi só um murmúrio do silêncio, que foi quebrado pelo barulho de pancada.
Ela não prestou muita atenção pra entender como exatamente aquilo aconteceu, mas Azure tinha o dom de aparecer sem aviso e um gancho de direita capaz de fazer um homem mais velho quase cair depois de alguns passos pro lado. O homem saiu correndo, aparentemente não sabia lidar com mais de uma pessoa, a ponta de faca que saiu voando ficou no chão.
-Obrigada... – Mika falou vendo a mão dele marcada do soco, ele ficou quieto algum tempo até estender a mesma mão na sua direção – Algum problema, Azure?
-Você se machucou... – ele falou tocando de leve no pescoço dela, o cheiro de sangue e as veias dele pulsando ali pertinho dos seus olhos, em plena luz do dia ela sentiu uma fome noturna.
-Não é nada. Vai ficar tudo bem agora, obrigada de novo... – ela respondeu cobrindo o arranhão com a mão e dando alguns passos seguindo seu caminho. Ele a seguiu puxando sua outra mão, passou por ela e continuou caminhando a puxando. – Azure?
-Não tinha treino de basquete hoje, então o Korone já estava em casa. Quando eu soube decidi te acompanhar. – Ele parou em uma esquina olhando para os lados – Era para a direita agora, não é?
-É... – por algum motivo se sentiu uma sinfonia, sendo conduzida pelo maestro, ficou quieta o caminho inteiro depois dali.

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