sexta-feira, 5 de setembro de 2008

8. Deixa

Ângelo se acalmou depois de encontrarem as duas garotas que haviam sumido em algum tipo de aventura adolescente, mas Korone continuava a chamar Mika de idiota depois de aparecer com um corte no pescoço, por mais que no dia seguinte ele tivesse desaparecido ser ferido por um humano era motivo de humilhação pra maioria dos monstros. Mas ela não se importava, na verdade nem sentira dor alguma, apenas uma completa dormência depois de chegar no portão de casa.
-Um abraço?
-É.
Azure a tinha segurado com força entre os braços, uma mão em suas costas e a outra em sua cabeça, ela deu graças a qualquer deus que pudesse existir por ainda ser de dia e não ter presas, o pescoço dele ali no alcance da sua boca, as batidas do coração, tudo dizia pra ela morder. Mas era dia, o sol machucava seus olhos e estava paralisada por algum tempo.
-E ele não disse nada? – Beau era curiosa demais.
Até tinha dito algumas coisas, ele perguntou se ela não percebia que tinha que tomar mais cuidado, se cuidar melhor. Ela simplesmente deu risada como quem se desculpa sem palavras, ele se afastou um passo, olhares se cruzando e apenas aquelas palavras que pareciam tão simples, mas fizeram o coração dela saltar: Me deixa cuidar de você então. Mas a aula começou, então Beau não ficou sabendo de nada daquilo, nem que depois daquele abraço ela ganhou outro beijo de boa noite. O dia passou mais rápido do que ela pensava.
-Korone, eu já estou indo...
-Eu vou mais tarde, vamos jogar mais uma partida. – ele respondeu dando longos goles numa garrafa de água, lançou alguns olhares por cima dela, enxergando Azure que esperava no portão. – Vem cá...
-Que? – ele puxou ela num abraço, fingindo que cochichava algo no ouvido dela enquanto comia. Mais cedo que o normal, mas ela não se importou. – Bom jogo...
Ele não respondeu, simplesmente deu as costas voltando pro campo. Azure não falou nada, apenas caminhava ao lado dela com as mãos enfiadas dentro do bolso, uma vez ou outra comentavam algo sobre as músicas ou qualquer outra casualidade, pararam antes de chegar na casa dela. Um parque cujos balanços estavam vazios, o olhar de Mika se prolongou para o vai e vem das correntes.
-Ainda está cedo...
-É... – ela respondeu com um sorriso se sentando num dos balanços, o céu ainda nem tinha começado a mudar de cor.
-Mika, você pensou no outro dia?
-Que dia?
-Quando você machucou o pescoço. O que eu te disse antes de ir embora. – ele estava sério, de pé olhando pra ela no balanço.
-Pensei. – Ela respondeu baixando os olhos e balançando de leve. – Você sempre foi muito gentil comigo, Azure. Mas não precisa se preocupar tanto.
-Não é só preocupação, sabia... – Ele falou enfiando as mãos nos bolsos.
-Ahn?
Ele tomou coragem, a vergonha saiu de seus bolsos e segurou o balanço com as duas mãos fazendo Mika parar, ficou ali segurando com o rosto na frente do dela enquanto pensava se falava ou calava. Acabou falando enquanto sorria, o rosto levemente corado do sol depois da caminhada, a respiração normal e o coração aos saltos, ela conseguia ouvir as batidas mesmo de longe.
-Eu não esperava por isso até começar e te ver todos os dias, mas eu acabei gostando muito de você. Não consigo evitar me preocupar... – Ele sorriu sem jeito soltando o balanço – Eu só quero seu bem, mais nada. Eu sei que você e o Korone... – ela riu – O que foi?
Ela levantou do balanço, aos poucos se tornará natural passar o tempo com ele. Mas agora e de vez em quando, inesperadamente ele fazia algo que não era cotidiano ou comum, seu coração dava pequenos saltos e seu rosto ficava mais quente. Ela também acabou gostando muito dele, assim de uma maneira muito comum e tranqüila, mas o que ele queria dizer com Korone? Ela não pode evitar rir, eles só eram comida um pro outro.
-Eu só fiquei feliz, por você gostar de mim... – ela respondeu abraçando ele que abraçou de volta o batimento cardíaco numa mistura de choque e felicidade.
-Eu posso cuidar de você então? – ele perguntou ao ouvido dela.
-Pode...
-E ficar ao seu lado?
-Claro.
-Ótimo...
Ela nunca poderia ter imaginado que o beijo dele fosse tão doce e morno, era como sobremesa. Se despedirem ali mesmo, enquanto o céu se coloria para dar lugar ao por do sol, laranja e amarelo rodopiando, enquanto no horizonte subia o vermelho que a lembrava do jantar. Entrou em casa distraída, nem notou que Ângelo estava no corredor até estar a menos de dois palmos dele, apenas sorriu um boa tarde enquanto passava, mas ele a puxou pelo braço.
-Me deixa saber o motivo de tanta felicidade?
-Não é nada, eu só não lembrava de como era bom alguém querer cuidar de você.
-Não me diga que você arranjou um namorado? – ele perguntava olhando por cima dos óculos.
-Algo assim... – ela respondeu curiosa – Por que?
-Nada...
Acabou soltando ela, se refugiou na cozinha comendo alguns sanduíches enquanto Korone não chegava, repensando argumentos de como aquilo era mal pensado e de como era complicado ter um relacionamento com alguém quando se é um monstro. Quando Korone chegou decidiu testar seus argumentos com ele, mas era difícil falar com alguém que te ignorava por completo indo direto para a geladeira.
-Você sabia que a Rinmotoki arranjou um namorado?
-Você está surpreso? – o outro replicou tirando uma garrafa de suco inteira e a virando num gole só.
-Você não? – Ângelo pos de lado os sanduíches que fez e não conseguiu comer.
-Estou sim, considerando que ela é uma vampira já devia ter uns 4 no mínimo. – Korone respondeu fazendo pouco caso e dando risada. – Isso não tem nada a ver comigo.
-E se ele descobrir que ela é uma vampira? Já pensou nos problemas que isso pode causar?
-Não enche, Ângelo. Eu saio com pelo menos três garotas por semana e você não tem essa crise toda... Deixa ela e não vem choramingar pra mim.
Então ele não se importava? O mesmo olhar despreocupado e desinteressado que todas aquelas garotas recebiam Ângelo sentiu na pele, o outro não estava nem aí pra suas preocupações. Tirou os óculos e achou por bem ir se deitar e decidiu não pensar mais naquilo. A verdade é que estava mais que surpreso, a principio achou que ela iria começar a sair com Korone, mas não... Aparentemente era aquele outro cara que a via todos os dias, ou quem sabe alguém que ele nem sabia quem era. Dividiam o mesmo teto, mas não conseguia deixar de notar que pareciam não dividir a mesma vida.

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